ALBUM DO PIBID

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lançamento do 1º livro do PIBID PEDAGOGIA E DE LETRAS que é resultado do trabalho conjunto com as escolas PARCEIRAS da rede municipal de ensino de SINOP/MT, cujo objetivo e antecipar o vínculo do fiando à formação docente na prática.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

ARTIGO


Educação ambiental e as novas tecnologias de informação e comunicação




Gelze Serrat de Souza Campos RodriguesI; Marlene T. de Muno ColesantiII

IDoutora em Geografia pela UFU/Analista Ambiental SEMAD E-mail: gelcampos@ig.ufu.br
IIProfª. Drª. do Instituto de Geografia da UFU E-mail: mmuno@ufu.br





RESUMO

Nos últimos vinte anos o desenvolvimento das novas tecnologias da informação e comunicação, bem como a ampliação de seus usos têm criado enormes expectativas e possibilidades na educação escolar. Em relação à Educação Ambiental, o uso das novas tecnologias de informação e comunicação representa um avanço no ensino formal, já que a integração da informática e dos multimeios propiciam a sensibilização e o conhecimento de ambientes diferenciados e dos seus problemas intrínsecos, por parte dos alunos, por mais distantes espacialmente que eles estejam.
A partir da concepção de uma Educação Ambiental vinculada à pedagogia da complexidade, esse artigo procura discutir a potencialidade do uso dos princípios da Educação Ambiental no suporte digital por meio do uso de imagens, textos e sons, implementados pela hipermídia, tecnologia não seqüencial, cujas informações são acessadas de modo associativo.

Palavras-chaves: Educação Ambiental. Hipermídia. Novas tecnologias de informação.

ABSTRACT

In the last twenty years, the development of modern information and communication technologies, as well as the enlarging of their use have created enormous expectations and possibilities on school teaching. Related to the Environmental Education, the use of modern information and communication technologies represents an advance, since the integration of information technology and multimedia allows the sensitive and knowledge of different environments and their specific problems, by the view of students, as far as they can be.
Through of the conception of Environmental Education linked to the complexity pedagogy, this article looked for argue the potentiality of work with principles of Environmental Education on support digital, using images, texts and sounds, implemented by hypermedia, no sequential technology, which information are accessed in associative way.

Keywords: Environmental Education. Hypermedia. Modern information and comunication.





INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas temos testemunhado o aparecimento de inúmeros movimentos em prol do meio ambiente. Em diversos países, programas e estratégias vêm sendo empreendidas com o intuito de frear a degradação ambiental e/ou de encontrar novas alternativas para processos de produção e consumo menos impactantes.

Dentro desse contexto práticas de Educação Ambiental têm sido intensificadas, tentando sensibilizar e informar as pessoas sobre a realidade ambiental, bem como mostrar e/ou indicar o papel e a responsabilidade da sociedade sobre o que ocorre no meio ambiente.

A expansão da Educação Ambiental tem se dado não apenas pelo crescimento do número de profissionais que tratam do tema, mas também por ter sido incorporada como componente importante em ações de diversas áreas tais como saúde, direitos sociais, gestão ambiental em unidades de conservação e setor industrial, dentre outras.

Ao mesmo tempo, um significativo número de pesquisas e pesquisadores, em várias áreas da ciência, tais como Geografia, Pedagogia, Biologia, Sociologia, tem se referido e se dedicado a projetos de Educação Ambiental, bem como vários países têm demonstrado interesse na sua fomentação, seja pela percepção cada vez maior de seu importante papel preventivo para alguns problemas ambientais, seja pelas exigências de organismos internacionais no sentido da instauração de políticas conservacionistas em que se inclui a Educação Ambiental.

Assim, nos últimos anos, instituições públicas e privadas vêm demonstrando interesse crescente em fomentar a Educação Ambiental, o que tem se dado de vários modos. Contudo, podemos considerar que as formas mais rotineiras na sua condução estão, de alguma maneira, relacionadas à:

Inclusão de temas ambientais no sistema educacional básico com o estabelecimento de programas institucionais voltados à Educação Ambiental;

Formação de pessoal necessário ao desenvolvimento da Educação Ambiental, por meio da inserção de cursos de temática ambiental na grade curricular dos cursos de graduação;

Criação de cursos de pós-graduação, lato e stricto sensu, para professores e outros profissionais, centrados em temáticas ambientais, a fim de complementar e atualizar a formação tradicional dos cursos de origem;

Elaboração de materiais didáticos, audiovisual ou impresso, para Educação Ambiental.

Concomitantemente, percebemos uma grande proliferação e abertura de novos espaços de comunicação para a Educação Ambiental, dentre os quais podemos citar fóruns, congressos e, no meio digital, a formação de redes e a multiplicação de sites na internet referentes ao tema, que acabam por sensibilizar a população em geral para os problemas da degradação ambiental.

De fato, os saberes vêm sendo elaborados no transcorrer da história humana, tendo como suporte várias tecnologias de informação e comunicação (TIC), que se modificaram sucessivamente desde o oral, passando pelo meio impresso e atingindo a informatização, o que "[...] não se dá por simples substituição, mas antes por complexização e deslocamento de centros de gravidade" (LÉVY, 1993, p. 10).

A partir, principalmente, da década de 1990, com o advento e popularização da Internet, presenciamos um novo deslocamento nesse "centro gravitacional", o que implica em inúmeras transformações para a vida humana, sobretudo no que diz respeito à circulação do conhecimento e às formas de conhecer. Essas alterações refletem-se, portanto, na nossa compreensão de mundo, no modo de representá-lo, e vêm acompanhadas por uma série de mudanças culturais, presentes no nosso cotidiano, seja no espaço de trabalho, de lazer e/ou de ensino.

No âmbito da Educação Ambiental, percebe-se uma intensificação na produção de material pedagógico, audiovisual e/ou impresso, relacionado ao meio ambiente, mas que, contudo, ainda em grande parte não refletem os objetivos explicitados no Programa Nacional de Educação Ambiental e muito menos a realidade sócio-ambiental do lugar, região e país, normalmente tendo uma ótica disciplinar, segmentada, e por vezes tendo como referência apenas valores de determinados segmentos sociais, variando em qualidade e consistência.

Em relação à nova modalidade de materiais didáticos baseados nas novas tecnologias a questão é ainda mais complexa, já que não há uma linguagem ainda estável, devido ao seu pouco tempo de existência o que impede a cristalização de "modelos de sucesso", o que leva realmente a experimentações dos mais variados tipos, como também a uma simples transferência de conteúdos e formas dos meios tradicionais para o meio digital.

Diante desse panorama e considerando o espaço geográfico como instância privilegiada de reprodução das relações de produção da sociedade e, portanto, estreitamente dependente das técnicas utilizadas, consideramos que os Sistemas de Informação Geográfica e a hipermídia têm uma ampla contribuição a oferecer em projetos e pesquisas de Educação Ambiental. Além do conhecimento geográfico propiciar a conservação do ambiente, suas técnicas possibilitam a construção de mecanismos interpretativos pelos indivíduos onde o território, em nosso contexto histórico atual "[...] inclui obrigatoriamente ciência, tecnologia e informação" (SANTOS, 1997, p.10), favorecendo o seu auto-reconhecimento como sujeitos sociais atuantes, real ou potencialmente, nos diversos espaços sociais entremeados e superpostos, em direção a uma melhoria da qualidade ambiental e, por conseguinte, de vida.

Sob essa perspectiva, consideramos que uma das formas que permitem a construção desses processos interpretativos é o uso de materiais didáticos como ferramentas úteis para a construção dos saberes, no caso, ambientais. Nesse sentido, esse artigo procura discutir referências que possam auxiliar na produção de materiais didáticos de Educação Ambiental em suporte digital, buscando-se estabelecer uma correlação entre Educação Ambiental e o uso da hipermídia.



EDUCAÇÃO AMBIENTAL: PRESSUPOSTOS E PRINCÍPIOS

Um percurso pela história e práticas da Educação Ambiental permite afirmarmos que apesar de ultimamente presenciarmos a publicação de uma série de obras relevantes acerca de Educação Ambiental no Brasil, ainda há certa carência metodológica entre seus praticantes e nos projetos que se desenvolvem.

De acordo com Pedrini (1997, p. 89) é comum dizer-se que muitos educadores ambientais "[...] falam sobre Educação Ambiental, mas poucos a praticam e estes, em geral, não partem de um referencial teórico ou a ele retornam em suas práticas, nem sempre fazendo reflexões sobre seu trabalho."

Ab' Sáber, em 1993, ao fazer uma reflexão sobre as críticas ao papel da universidade na reconceituação da Educação Ambiental, salienta que a prática de "[...] educação ambiental exige método, noção de escala, boa percepção das relações entre tempo, espaço e conjunturas; conhecimentos sobre as realidades regionais e, sobretudo, códigos de linguagem adaptados às faixas etárias do alunado" (AB'SÁBER, 1993, p.114).

A falta de uso de um arcabouço teórico-metodológico pode, desse modo, comprometer a proposição de valiosas e interessantes atividades tornando-as um conjunto de práticas desarticuladas e que resultem apenas em ações ineficientes no sentido da construção de novos hábitos e atitudes. Podem resultar, sobretudo, em práticas específicas tais como coleta seletiva de lixo, organização de hortas, dentre outras, ou em mero conteúdo naturalista a ser aprendido em aulas de Geografia, Biologia ou Ciências, mas que não desencadeiam isoladamente uma nova visão de mundo.

De fato, as ações educativas, dentre elas a construção de materiais didáticos, baseadas nos princípios da Educação Ambiental, devem voltar-se à formação de atitudes ecológicas e cidadãs (CARVALHO, 2004) que pressupõe o desenvolvimento de capacidades e sensibilidades para identificar e compreender os problemas ambientais, mobilizar-se e comprometer-se com a tomada de decisões voltadas à melhoria da qualidade de vida, implicando uma responsabilidade ética/social e justiça ambiental.

Claro que distintas modalidades de ensino requerem metodologias específicas. Entretanto, podemos considerar que alguns pressupostos são básicos e servem de orientação para o encaminhamento de uma prática ambiental, cujas atividades são articuladas pedagogicamente e encontram-se comprometidas com outros processos sociais, apontando claramente as múltiplas e complexas determinações dos problemas ambientais e indicando as formas de ação para combater as suas causas e não apenas os efeitos mais aparentes.

Outro ponto a ser lembrado é que a construção de materiais didáticos em geral deve levar em conta a introdução progressiva dos temas a serem tratados, a sua seleção e hierarquização (LITWIN, 2001). Contudo, a produção de um material didático em meio digital, cuja característica principal é a não-linearidade, pressupõe que a questão da progressividade da apresentação dos temas não ocorre, restando ao realizador fazer apenas a seleção dos temas e uma certa hierarquização em relação aos tópicos apresentados. Isso implica em um recorte temático, relacionado, portanto, diretamente à própria visão da problemática pelo realizador, "[...] suas formas de pensar o campo, suas leituras e seu posicionamento em face do conhecimento." (LITWIN, 2001, p. 83).

Tendo em mente tais considerações é importante tomar-se como base para a construção do material didático alguns princípios que procuram de algum modo articular informações do conhecimento científico e de experiências técnicas em que ocorre um entrecruzamento bastante complexo, mas necessário, já que as particularidades da temática permitem diversos enfoques, intrinsecamente dependentes das concepções de Educação, Ambiente e Comunicação, bem como da própria postura em relação à inserção das ferramentas tecnológicas na educação.

Assim, primeiramente, para se entender melhor a dinâmica na qual se insere a Educação Ambiental e suas diversas significações e práticas desenvolvidas atualmente, faz-se necessário relembrar alguns momentos que influenciaram o engendramento das primeiras preocupações com a qualidade ambiental e conseqüentemente instigaram a formulação dessas variadas conceituações, o que pode ser traçado tendo como base importantes eventos científicos e sociais, de âmbito internacional.

A preocupação com a temática ambiental não é recente. Apesar de nosso intuito nesse trabalho não ser fazer uma digressão histórica, uma vez que outros estudos com ênfase nesse objetivo já o fizeram, deve-se destacar que a literatura aponta que muito antes, ainda no século XIX, já ocorria a preocupação de algumas pessoas, de alguns setores da sociedade, com o ambiente e com a ação antrópica devastadora sobre ele.

Diegues (1987) lembra que no século XIX, com o avanço da História Natural e, portanto, graças aos estudos divulgados pelos naturalistas europeus, os espaços não transformados pela ação antrópica passam a ser valorizados e a vida nas cidades começa a ser criticada devido à poluição e ao crescimento populacional urbano.

O autor ainda aponta que idéias preservacionistas e conservacionistas da natureza já se disseminavam nos EUA, o que resultou inclusive na criação do primeiro parque nacional do mundo – o de Yellowstone, em meados do século XIX, dentro de uma ótica de proteção de grandes áreas naturais à disposição das populações urbanas para fins de recreação.

Do mesmo modo, o botânico e sociólogo britânico, Patrick Geddes, considerado por alguns estudiosos como o "pai da Educação Ambiental" (DIAS, p.76, 1991), em seu livro "Cidades em Evolução", por meio de reflexões sobre o processo de urbanização, decorrente da Revolução Industrial, relata os seus efeitos para a qualidade ambiental, bem como evidencia a necessidade de que o "[...] cidadão comum tivesse uma visão e compreensão das possibilidades de sua própria cidade" (GEDDES, 1994, p.15).

Até a década de 1950 praticamente não havia nenhuma preocupação com os efeitos ambientais da industrialização. Só em 1952, após uma grande manifestação da incongruência entre as atividades antrópicas contemporâneas e o ambiente, com a morte de 1600 pessoas provocada direta ou indiretamente pelos níveis insustentáveis da poluição atmosférica de Londres, é que uma maior sensibilização coletiva sobre os problemas ambientais ocorrerá, desencadeando "[...] uma série de discussões em outros países, catalisando o surgimento do ambientalismo nos Estados Unidos a partir de 1960" (DIAS, 1991, p.77).

Assim, ao final da década de 1960, o conceito de Educação Ambiental emerge e, em 1971, a primeira definição internacional da Educação Ambiental é adotada pela International Union for the Conservation of Nature (SATO, 2004), ainda essencialmente ligada à questão da preservação de ambientes naturais e dos seus sistemas de vida.

Apenas a partir de 1972, com a Conferência Internacional sobre o Meio Ambiente, em Estocolmo, promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU), é que o homem passa a ser considerado como peça chave do processo de conservação ambiental e, de acordo com Sato (1997), a Educação Ambiental vai sendo compreendida de forma mais abrangente.

Em 1977, ocorre a I Conferência Intergovernamental de Tbilisi, organizada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) com a colaboração do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), podendo ser considerada o ponto culminante do Programa Internacional de Educação Ambiental, estabelecido em 1972.

Nessa Conferência é estabelecida a natureza da Educação Ambiental (EA) e definidos seus princípios, objetivos, características, bem como as estratégias a serem adotadas para sua efetivação. A interdisciplinaridade, a perspectiva regional e mundial inter-relacionada e a continuidade passam a ser indicadas como suas características principais. Apesar de se reconhecer que a educação não pode resolver por si só todos os problemas ambientais globais, afirma-se que, com a ajuda da ciência e da tecnologia, pode contribuir para a formulação de outras soluções que visem uma nova ordem internacional, onde o crescimento econômico seja controlado e haja uma distribuição eqüitativa dos benefícios do progresso.

Estavam, assim, plantados os princípios e características da Educação Ambiental, cabendo a cada país, de acordo com suas peculiaridades sócio-ambientais, definir as linhas de atuação nacionais, regionais e locais.

Em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD/UNCED), realizada no Rio de Janeiro, também denominada de RIO-92, ECO-92 ou Cúpula da Terra, promove discussões que culminam em novas concepções sobre as formas de se conhecer as questões ambientais.

Dentro desse contexto, a admissão da necessidade de se considerar a dimensão social dessas questões conduziu ao uso da designação socioambiental, que além de destacar a sociedade como elemento constituinte da questão ambiental, manifesta a busca, por parte dos cientistas, de conceitos que os auxiliem no processo de compreensão dessa realidade complexa.

Concomitantemente à Conferência "oficial" da ECO-92, ocorria em espaço paralelo, o Fórum Global 92, cujos participantes, em sua maioria, Organizações Não-Governamentais (ONGs) juntamente com outros setores da sociedade civil, aprovaram a "Carta da Terra". Tal documento apresenta uma série de princípios relacionados ao respeito ao meio ambiente, à integridade ecológica, contemplando também a justiça sócio-econômica e a paz, no intuito de se alcançar uma melhor qualidade de vida para todos. Ressalta, também, a importância da inserção na educação de conhecimentos, valores e habilidades necessários para o modo de vida sustentável, realçando a importância dos meios de comunicação de massa nesse processo, no sentido, principalmente, da sensibilização da população para as questões ambientais.

Juntamente com a Carta da Terra elaborou-se o "Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global", documento de apoio para a Educação Ambiental, que a reconhece como "[...] um processo de aprendizagem permanente, baseado no respeito a todas as formas de vida" (SATO, 2004, p. 17). Além disso, afirma o seu papel estimulador à formação de sociedades socialmente justas e ecologicamente equilibradas, o que requer responsabilidade individual e coletiva em níveis local, nacional e planetário, enfatizando o seu caráter político, no sentido de estar baseada em valores que devem se orientar para a transformação social.

Os resultados práticos dos tratados assinados (Quadro 1) apesar de pequenos, explicitam de modo contextualizado uma forma específica de se compreender a Educação Ambiental, que foi se multiplicando e desencadeando perspectivas mais amplas, complexas e efetivamente socio-ambientais, em contrapartida à ótica "biologizante" inicial.








Atualmente, o termo socioambiental tem seu uso preferido em detrimento ao conceito ambiental, principalmente por pesquisadores e organizações governamentais e não-governamentais. Tal preferência talvez seja fruto da expressão ambiente ainda aparecer eivada por uma origem profundamente naturalista, sendo, portanto, insuficiente, para abarcar a problemática ambiental atual, resultante da interação sociedade-natureza. Acima de tudo, por meio da adição do sufixo sócio, tem-se o processo de ênfase, que Mendonça julga necessário para "[...] posicionar a sociedade enquanto sujeito, elemento e parte fundamental dos processos relativos à problemática ambiental contemporânea" (MENDONÇA, 2002, p. 126).

A partir da Rio-92, portanto, a Educação Ambiental passa a ser inserida dentro do contexto escolar de maneira cada vez mais abrangente e diversificada, estritamente dependente da perspectiva educacional e da conotação que se tem de ambiente, mas de modo geral com uma orientação para a sustentabilidade, enfatizada em 2002, na declaração da ONU que decreta "[...] o período de 2005-2014 como o decênio da educação para o desenvolvimento sustentável" (ZAKRZEVSKI, 2004, p.81).

A orientação da Educação Ambiental para a sustentabilidade tem sido, portanto, crescentemente enfatizada e é objeto de análises de diversos pesquisadores, dentre os quais se destaca Leff (2002), para o qual o discurso do desenvolvimento sustentável não é homogêneo, exprimindo as diferentes visões que se têm correspondentes aos diversos interesses da sociedade, indo desde a perspectiva neoliberal até propostas decorrentes das "novas racionalidades produtivas".

Deve-se ressaltar que são inúmeras as definições encontradas para sustentabilidade, elaboradas ao longo dos últimos anos, sendo que de acordo com Paehlke (1989), o termo sustentabilidade foi criado ainda no século XVIII, para designar aquele solo que fosse cultivável e capaz de sustentar uma produção estável, a longo prazo, indicando, portanto, o caráter de suporte da natureza para o processo de produção, posteriormente reconhecido cientificamente.

Atualmente, coexistem perspectivas do desenvolvimento sustentável economicistas que privilegiam o livre mercado como mecanismo de valorização da natureza; propostas tecnológicas que enfatizam a reciclagem de rejeitos e a adoção de tecnologias limpas e as éticas, cuja preocupação orienta-se em direção às mudanças de valores e comportamentos como pré-requisito fundamental para se alcançar a sustentabilidade.

Para Leff (2002), as duas primeiras perspectivas transferem a responsabilidade da sustentabilidade às nações com maior poder econômico, comercial e tecnológico, colocando os países mais pobres em uma posição de subordinação e dependência, desvalorizando "[...] o processo educativo como base fundamental da formação de capacidades endógenas na transição para a sustentabilidade" (LEFF, 2002, p. 249).

Ferreira, sob outro enfoque, argumenta que atualmente a sustentabilidade é "[...] um conceito transversal que abrange todas as dimensões da vida humana, não apenas as relações diretas com a natureza." (FERREIRA, 2006, p. 318). Aliás, essa idéia de multidimensionalidade pode ser considerada como um dos únicos pontos em comum em quase todas as definições de sustentabilidade, que costumam se polarizar em posturas, designadas por Lima (2002) como, conservadoras ou emancipatórias .

As posturas conservadoras, relacionadas com as abordagens economicistas e tecnológicas, tenderiam a capitalizar e direcionar a proposta de sustentabilidade para aquilo que se convencionou ser denominado como desenvolvimento sustentável. Concepção que foi sendo institucionalizada e propalada principalmente a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1992, inscrevendo-se aos poucos no discurso oficial, empresarial e na linguagem comum. Tais propostas tentam diluir a contradição entre conservação do ambiente e crescimento, sendo orientadas no sentido da manutenção da atual estrutura sócio-econômica.

As emancipatórias, relacionada com a abordagem ética, tenderiam a proposições direcionadas à reconstrução da ordem sócio-econômica, das bases de produção e do consumo vigentes "[...] para construir uma nova racionalidade produtiva, fundada no potencial ecológico e em novos sentidos de civilização a partir da diversidade cultural do gênero humano" (LEFF, 2002, p. 31).

Tomando outra perspectiva Gadotti (2004) sustenta que o conceito de desenvolvimento sustentável deve ser tomado como uma "idéia-força", mobilizando os cidadãos para a construção de um ambiente socialmente justo e ecologicamente equilibrado.

No Brasil, os documentos nacionais direcionados à Educação Ambiental (Quadro 2) possuem uma orientação oscilante entre a abordagem conservadora e emancipatória, podendo ser observado uma preocupação constante com as mudanças de práticas e atitudes da sociedade, mas que algumas vezes não alcançam uma maior inquietação em termos de mudança dos padrões de consumo e produção.








Em decorrência de todo esse processo, a Educação Ambiental vai adquirindo um papel estratégico no processo educacional, propiciando a formação de valores e atitudes que se associam com a sustentabilidade ambiental e a eqüidade social.

Leff observa que a Educação Ambiental deve ser devotada à construção de um saber transformador da relação sociedade-natureza que

[...] coloca o problema da articulação das espacialidades e temporalidades de diferentes processos naturais e sociais: a harmonização e conflito entre os ciclos econômicos e ecológicos, entre a valorização econômica e os valores culturais; entre a maximização dos ganhos, dos tempos de regeneração dos recursos naturais e dos processos de inovação e assimilação tecnológica; entre os diferentes espaços ecológicos, geográficos, culturais, políticos e econômicos onde se concretizam as ações da gestão ambiental (LEFF, 2002, p. 152).

O autor destaca ainda o importante papel da ciência da educação nessa empreitada. Nesse sentido, a interdisciplinaridade, a valorização da percepção da comunidade na resolução dos problemas ambientais de diferentes escalas, diretrizes propostas na Conferência de Tbilisi, retificadas na Rio-92 e contempladas pela PNEA do Brasil, juntamente com o princípio da complexidade, se consubstanciam como alicerces principais, sobre os quais deve ser construída essa nova dimensão da educação – a ambiental.

A partir da década de 1990, uma nova tentativa de integrar as partes ao todo e o todo às partes vem tomando corpo, consubstanciando a busca de manter juntas perspectivas tradicionalmente consideradas como antagônicas, tais como a universalidade e a singularidade. O conjunto torna-se, assim, conforme Morin (2002), uma unidade relativamente autônoma, superior ou não à organização anterior de que provém, mas conservando em sua memória os traços de sua heterogeneidade constitutiva.
Nessa perspectiva, não há uma dicotomia entre objetos simples e objetos complexos, ou entre suas propriedades. Quem lhe empresta essas características é o pesquisador. Assim, se na racionalidade clássica o mundo obedecia a um princípio de ordem e de organização, a partir do momento em que uma inteligência da desordem se elabora para refinar, enriquecer e tornar mais sutil o olhar que se dirige aos fenômenos, ele se complexifica. Às características de base, que se tornaram clássicas, acrescentam-se a partir de agora o plural e a heterogeneidade, sobretudo de olhares, o que resulta na valorização da multirreferencialidade.

Morin (2002) considera a complexidade como uma forma de enxergar o mundo como um sistema complexo, cujas "[...] desordem, incerteza, antinomia fecundam um novo tipo de compreensão e explicação, o do pensamento complexo" (MORIN, 2002, p.457).

As questões ambientais, portanto, implicam em levar em consideração a complexidade dos sistemas envolvidos, a multiplicidade de seus componentes (físicos, químicos, biológicos, ecológicos, humanos e sociais), a não-linearidade dos fenômenos subjacentes, e, sobretudo, a estrutura espacial e as diferentes escalas espaciais e temporais de suas causas e efeitos.

Dessa forma a investigação das questões ambientais implica na necessidade do enfoque interdisciplinar, mobilizando em diferentes graus de intensidade todas as disciplinas. Isso pode e deve levar à integração de processos naturais e sociais de diferentes ordens de materialidade e esferas de racionalidade e à formulação de novas estratégias conceituais para a construção, sob o enfoque emancipatório, de uma nova ordem teórica que questione a atual racionalidade econômica e processos de produção.

Embora o enfoque interdisciplinar permita uma visão mais integradora de ambiente, Leff (2002) observa que, em alguns casos, a interdisciplinaridade ao integrar processos de diferentes naturezas – social e ambiental - pode cair em um reducionismo teórico.

Assim, apesar da interdisciplinaridade ser um ponto de referência constante nos projetos de Educação Ambiental, não significa que pesquisas monodisciplinares não possam ser efetuadas, já que a generalização integrativa dos processos socioambientais é muitas vezes insuficiente para a construção de metodologias interdisciplinares de pesquisa.

No momento, inclusive, é bastante difícil a condução de pesquisas de qualidade sem se dispor do apoio das disciplinas específicas, o que deve ser concretizado em dois níveis: o primeiro relacionado com o desenvolvimento de técnicas e métodos adequados à pesquisa ambiental; e, o segundo, referente a um autêntico trabalho de pesquisa na disciplina de modo a abrir novos horizontes de ação, principalmente de ação interdisciplinar.

Do mesmo modo, Leff (2002) salienta que o saber ambiental não se constitui em um saber homogêneo. É um saber que vai sendo estabelecido na relação com o objeto e o campo temático das diversas áreas de conhecimento, definindo-se então o ambiental de cada ciência, o que então abre espaço para a interdisciplinaridade, com a formulação de novas teorias, disciplinas e técnicas.

Assim, as práticas de Educação Ambiental devem se vincular a uma pedagogia da complexidade, onde existe espaço para a mono, inter e transdisciplinaridade, a fim de se "[...] induzir e fomentar as capacidades e habilidades mentais para ver o mundo como sistemas complexos, para compreender a causalidade múltipla, a interdeterminação e interdependência dos diferentes processos" (LEFF, 2002, p. 250), estimulando o pensamento crítico, participativo e propositivo dos educandos e da comunidade, sendo que esse impulso ao saber ambiental crítico deve se dar por vários espaços de comunicação e com apoios tecnológicos diferenciados.



AS NOVAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

Definir conceitualmente tecnologia da informação e comunicação é um trabalho árduo, tendo em vista a sua composição por três diferentes conceitos, que possuem várias significações conforme as suas aplicações nas mais variadas áreas do saber humano e de acordo com o contexto histórico em que são utilizados.

Uma das formas da resolução desse impasse é tomar conhecimento das conceituações dos três elementos que constituem a tríade tecnologia/informação/comunicação.

Assim, primeiramente, atendo-se ao vocábulo tecnologia, tem-se que as raízes gregas téchne e logos correspondem, respectivamente, à idéia de "arte", "ofício", "indústria" e ao conceito de "palavra", "tratado", "estudo", "ciência". Dessa forma, para os filósofos gregos a téchne não era um ofício ou arte qualquer, mas aquela que deveria ser realizada de acordo com o estudo, com a ciência.

De fato, todo o desenvolvimento da relação entre sociedade e natureza se fez pela substituição de um meio natural por uma técnica, elaborada de acordo com o seu estágio de conhecimento. A noção de técnica adquire um papel tão importante no desenvolvimento das sociedades que Santos (1997) propõe a divisão da história do meio geográfico em três etapas: meio natural, meio técnico e meio técnico-científico-informacional.

No meio natural, as técnicas se conciliam com as propriedades da natureza que eram a base material para a existência dos agrupamentos humanos. A partir do Paleolítico Superior técnicas complexas já são adotadas na defesa, alojamento, vestimentas, agricultura, que "[...] não eram agressivos, pelo fato de serem indissolúveis em relação à Natureza que, em sua operação, ajudavam a reconstituir" (SANTOS, 1997, p.188).

No período técnico, a fusão entre técnica e conhecimento será ainda mais ressaltada quando a Enciclopédia Francesa incorpora a técnica à ciência, o que origina a definição da tecnologia como sendo uma técnica que emprega conhecimentos científicos e dá à ciência uma aplicação prática através do uso da tecnologia. Os objetos técnicos, maquínicos, juntam à razão natural sua própria razão, uma lógica instrumental que desafia as lógicas naturais, criando, nos lugares atingidos, mistos ou híbridos conflitivos [...]. (SANTOS, 1997, p.189).

Nas sociedades contemporâneas a tecnologia vai ocupando cada vez mais um lugar de destaque na organização das práticas sociais, gerando efeitos em todo o universo social e criando dinâmicas diferenciadas onde o conhecimento passa a tomar um lugar central. De acordo com Santos (1997) essa interação entre ciência e tecnologia se dá de um modo tão intenso, que alguns autores preferem denominá-las com um único conceito – o de tecnociência, enfatizando o seu atual estado de fusão.

Indo além, Santos (1997) propõe que o atual período técnico em que vivemos seja denominado de técnico-científico-informacional tendo em vista que:

A idéia de ciência, a idéia de tecnologia e a idéia de mercado global devem ser encaradas conjuntamente e desse modo podem oferecer uma nova interpretação à questão ecológica, já que as mudanças que ocorrem na natureza também se subordinam a essa lógica (SANTOS, 1997, p. 190).

Assim, chegamos ao segundo elemento da tríade – informação, sua raiz latina informare significa "a ação de formar matéria". De acordo com Wurman, até a década de 1940, o conceito de informação é extremamente ligado à "[...] ação de informar; formação ou moldagem da mente ou do caráter, treinamento, instrução, ensinamento, comunicação de conhecimento instrutivo" (WURMAN, 1991, p. 42). Com o desenvolvimento da informática, o conceito de tecnologias da informação vai paulatinamente abarcando as tecnologias relacionadas à informática, utilizadas para transmitir a informação.

Deve-se ressaltar que a partir do final da II Guerra Mundial, a informação perde o caráter de elemento(s) que deve(m) levar à redução do grau de incerteza sobre um determinado assunto, passando a ter um significado ligado ao ato comunicante, podendo designar qualquer coisa que fosse comunicada, transmitida, seja ela compreendida ou não.

A partir de então um outro elemento passa a ser valorizado e agregado às tecnologias de informação – a comunicação. Importância essa delineada por Schaun, ao declarar que:

A comunicação está em tudo. Tudo é comunicação, transitando num pântano invisível, transparente, entre linguagens, palavras, discursos, sons, fala, imagens, narrativas, abrigando, ainda, a discussão de uma nova dimensão da realidade, propi-ciada pela velocidade da luz (SCHAUN, 2002, p. 30).

Propondo um outro olhar, mais próximo inclusive da concepção grega de técnica, Silva (2002) observa que as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) estão presentes ao longo de todo o processo de desenvolvimento humano, considerando tecnologia de informação toda configuração comunicativa que utiliza como apoio as tecnologias disponíveis no seu contexto histórico, estando ela, portanto, relacionada à informática ou não.

Com o aperfeiçoamento dos microprocessadores, com a digitalização da informação, sua disseminação e popularização, estabelece-se um ajuste estratégico entre o audiovisual, a informática e as telecomunicações, o que resulta na comunicação virtual e nas denominadas novas tecnologias de comunicação e informação.

Lévy (1993) aponta que essas diferentes técnicas de comunicação propiciam mudanças em toda parte, ao nosso redor, mas também em nosso interior, na forma de conhecer o mundo, no modo de representá-lo, na transmissão dessas representações, às vezes pouco perceptíveis, mas bastante marcantes.

Esse pesquisador argumenta ainda que contemporaneamente estamos no limiar de uma revolução radical da inteligência, na qual, diferentemente das transformações ocorridas, derivadas pelo uso de outros suportes de comunicação em massa, propicia uma mudança muito mais radical e transformadora do que a invenção da imprensa, encontrando paralelo apenas na invenção da escrita alfabética. De fato o desenvolvimento da Internet fundiu campos que até então pareciam distintos, ocorrendo um estilhaçamento entre as fronteiras da cultura, comunicação e informação.

Desde a década de 1960, o uso das tecnologias de informação e comunicação, dentre elas o computador, têm propiciado também um avanço vertiginoso no armazenamento, manuseio, tratamento e comunicação de informações sobre o espaço geográfico, levando ao desenvolvimento dos denominados Sistemas de Informação Geográfica (SIG), os quais acabam por não se conceituar mais apenas nas suas funções sobre o dado manuseado, ou seja, não se restringe às suas potencialidades tecnológicas de estoque de dados geográficos ou de análise e manipulação, mas sim sobre essa atual faceta de nova mídia de dados geográficos e, portanto, de informações geográficas, passíveis de serem utilizadas em Educação Ambiental.

O advento de novas tecnologias de informação e comunicação permitiu que informações antes restritas aos meios acadêmicos e técnicos fossem veiculadas pelas mass mídia, democratizando um pouco mais o acesso a essas informações e favorecendo a reflexão sobre uma nova faceta dos SIGs – o de sua natureza como mídia de informações espaciais, tornando-se um conceito conhecido em várias áreas do conhecimento.

A Web passa cada dia mais a se constituir como um grande canal de divulgação. Primeiramente, voltada à transmissão de informações textuais, posteriormente abrangendo figuras em geral e atualmente, difundindo músicas, fotografias, filmes, mapas, de todas as partes do mundo para todas as partes do mundo. O uso da internet, como meio de comunicação e informação, realmente acarretou uma verdadeira revolução em termos de tratamento e processamento de todo tipo de informação, inclusive daquela geograficamente espacializada, como em relação à própria concepção de SIG e de cartografia, bem como da forma de conceber, representar e analisar o espaço geográfico.

Apesar de tradicionalmente os cartógrafos sempre tratarem da questão da visualização do dado geográfico nos mapas, atualmente uma atenção maior tem sido dada à questão, já que em alguns casos a comunicação da informação geográfica e, portanto, a sua visualização, pode ser a principal função a ser exigida do mapa.

Tal importância é enfatizada pelas possibilidades que o ambiente digital fornece de linkar material visual diverso e mesmo som com mapas, sendo dado o nome de multimídia a essa possibilidade de comunicação proporcionada pelo uso dos vários meios de representação da informação, como som e imagem animada, além da imagem estática.

A multimídia normalmente é implementada pela hipermídia, tecnologia não seqüencial, organizada pelo link de pedaços de informações, em modo associativo, onde o leitor lê o texto de um nó para outro, não o lendo de forma integral, do início ao fim, como um texto impresso, e utilizando diversas mídias, tais como: texto, mapas, gráficos, vídeo, dentre outros.

A tecnologia do hipertexto, portanto, procura de uma certa forma reproduzir a maneira associativa de organizar as informações, o que foi possível com a criação e melhoramento de uma série de interfaces, tais como os ícones dos programas e a disseminação de seus significados globalmente, o desenvolvimento do mouse que permite a interação do usuário com a tela, a criação dos menus que mostram ao usuário as operações passíveis de serem realizadas e dos programas que permitem a digitalização de músicas e fotos.

Tais interfaces possibilitaram o desenvolvimento e a propagação de forma rápida e contínua do hipertexto, o qual, segundo Lévy (1993), pode ser caracterizado por meio de seis princípios abstratos:

Princípio da metamorfose – o hipertexto possui uma estabilidade dinâmica, já que seus elementos estão em "permanente jogo" com os seus usuários;

Princípio de heterogeneidade – o hipertexto mobiliza pessoas, elementos (imagens, sons, palavras, modelos), formatos de mensagens (multimídias analógicas, digitais), sensações de todos os tipos possíveis;

Princípio de multiplicidade e de encaixe – os nós e conexões de um hipertexto propiciam a conexão com uma série de outros nós e conexões, podendo se repercutir na vida de milhões de pessoas;

Princípio da exterioridade – o crescimento e redução, a composição e recomposição de um hipertexto dependem de um exterior indeterminado;

Princípio de topologia – no hipertexto os elementos ocorrem de acordo com um caminho, uma topologia;

Princípio de mobilidade dos centros – o hipertexto não possui um centro e sim vários centros móveis que pulam de um para outro.

A interatividade é o elemento principal dos projetos de hipermídia. Baseando-se na concepção sociológica de interação que remete "[...] à ação recíproca entre dois ou mais atores onde ocorre intersubjetividade, isto é, encontro de dois sujeitos – que pode ser direta ou indireta (mediatizada por algum veículo técnico de comunicação, por exemplo, carta ou telefone)" (BELLONI, 2001, p. 58), designa ora a potencialidade técnica de determinado meio fornecer um determinado nível e quantidade de informação que se quer acessar pelo usuário, de acordo com o seu ritmo e interesse próprios, ora a ação do usuário sobre a máquina e uma resposta da máquina sobre essa ação.

A possibilidade de navegação - acesso a dados variados, de fontes variadas – também é fundamental aos mapas e sistemas interativos, pois fornece informação adicional sobre determinado item quando certas funções são selecionadas, resultando na não linearidade, ou seja, na falta de limitação do usuário a uma dada seqüência de informações e de tempo.

Além dessas características específicas, o processo de mudança de suporte das informações para o meio digital acarreta alterações na forma de pensar, que passa a funcionar de modo "tissular (de tecido), em rede, gerando [...] formas de comunicação" (TRAJBER, 2001, p. 17) e de aprendizagem diferentes das tradicionalmente utilizadas, o que implica também em um redimensionamento das relações entre comunicação e educação.

Para Passarelli (1993) o uso de computadores no processo de ensino/aprendizagem tem como base três principais teorias: a Teoria Behaviorista, a Teoria de Sistemas e a Teoria Cognitivista. As primeiras atividades de instrução baseadas no uso do computador, bem como as estratégias tecnológicas utilizadas, que deram origem ao ensino programado, foram sustentadas pela Teoria Behaviorista, cujo princípio norteador é a atividade instrucional planejada de acordo com os comportamentos desejáveis do aprendiz, os quais devem ser observados e quantificados.

A Teoria dos Sistemas, de modo mais amplo, trata da organização e estrutura dos organismos como um todo. Seus "pressupostos epistemológicos possuem [...] uma concepção interdisciplinar (integradora) da ciência [...] aplicável ao processo educacional com a finalidade [...]" (PONS, 2001, p.59-60) de fazer uma análise e intervenção sobre o sistema denominado "processo educacional".

Já a abordagem cognitivista se preocupa principalmente no que tange ao processamento da informação, em entender como se processam e podem ser estimuladas operações tais como: codificação, armazenamento, comparação das informações pela inteligência humana.

De acordo com Yildirim (2005), uma das formas de alcançarmos tal propósito é utilizar o computador como uma ferramenta cognitiva, que não apresente apenas a informação, mas também estimule os usuários a acessar, analisar, interpretar e organizar seu conhecimento pessoal a partir de problemas propostos.

Para tanto é de extrema necessidade que um contexto de aprendizagem construtivista seja disponibilizado aos usuários, em que o uso de múltiplos modos de representação e perspectivas, a ocorrência de experiências realistas e relevantes e a consideração das características sociais dos alunos devem ocorrer.

De acordo com Silva, trata-se de fato da construção de um novo paradigma de aprendizagem, onde o processo de aprendizagem consiste no saber interagir com as fontes de conhecimento existentes de outros detentores/processadores do conhecimento, onde o professor adquire um importante papel, uma vez que:

Passar de um conhecimento intuitivo e sumário do senso comum para um conhecimento reflexivo em que o indivíduo seja capaz de organizar, associar e estabelecer relações com as informações não se alcança com a imediaticidade do direto [...] a navegação pelos oceanos informáticos requer a intermediação humana, notadamente a dos professores. [...] A emancipação que a Web proporciona não passa pela supressão dos intermediários, mas antes pelo reconhecimento do seu papel (SILVA, 2002, p. 79).

Tratando-se da Educação Ambiental, o professor deve conseguir problematizar o saber ambiental apresentado no suporte digital, colocando-o em uma perspectiva onde os alunos possam se apropriar e utilizá-lo para a construção das atitudes ecológicas.

Nesse tocante, deve-se ressaltar a distinção entre atitude e comportamento, sendo a primeira um modo de proceder, orientada pelos posicionamentos do indivíduo, enquanto que a segunda, "[...] ações observáveis, efetivamente realizadas, e podem estar ou não de acordo com as atitudes do sujeito" (2004, p.177).

Considerando outro aspecto, Belloni adverte sobre a necessidade urgente da integração das novas tecnologias de informação e comunicação nos ambientes escolares, sob pena de perder

[...] o trem da história, perder o contato com as novas gerações e tornarem-se obsoletas como instituições de socialização; por outro lado, não se pode pensar que a introdução destas inovações técnicas possa ocorrer, como parecem acreditar muitos administradores e acadêmicos, sem profundas mudanças nos modos de ensinar e na própria concepção e organização dos sistemas educativos, gerando profundas modificações na cultura da escola (BELLONI, 2001, p. 68).

A educação, de fato, sempre se constituiu em um processo de comunicação. Desde tempos remotos da nossa civilização, educação, informação e comunicação sempre caminharam juntas. No modelo tradicional isso se dá por meio da veiculação e divulgação de mensagens verbais e não-verbais, de conteúdos curriculares, entre um professor (emissor) e o aluno (receptor). A ação comunicativa de um conteúdo educativo, entretanto, só se dá plenamente quando não se reduz à essa concepção tradicional de transmissão de informações.

Com a inserção das novas tecnologias de informação e comunicação na educação, esse modelo passa a ser um fluxo comunicativo onde o aluno se torna também produtor e criador de mensagens, construindo "[...] gradualmente a sua visão de mundo a partir de um conjunto de espaços que hoje trabalham o conhecimento, e a conexão da escola com estes diversos universos, tornada possível pelas novas tecnologias que são essenciais" (DOWBOR, 2004, p.47).

Nesse caso, o uso das novas tecnologias de comunicação com enfoque na Educação Ambiental representa um avanço, já que por meio da integração da informática e dos multimeios pode haver a sensibilização e o conhecimento dos ambientes e dos seus problemas intrínsecos.

A virtualidade nesse sentido pode representar um novo esforço na construção e incorporação de conhecimentos ambientais por meio de estratégias mais atrativas de comunicação.



REFLEXÕES FINAIS

A crise ambiental no mundo reflete os modelos contemporâneos constituídos de sociedade e de produção/consumo, resvalando em uma crise sobre o conhecimento científico e as disciplinas tradicionalmente constituídas, criando ao mesmo tempo a necessidade de novos saberes e conhecimentos.

As diferentes tecnologias implicam mudanças nas atitudes, valores e comportamentos, nos processos mentais e perceptivos, demandando novos métodos educacionais e racionalidades pedagógicas sintonizadas com as necessidades das novas gerações, já que o processo educacional é um ato comunicativo e se não há sintonia não há comunicação.

Considerando essa perspectiva, nosso estudo procurou discutir aspectos relacionados à interação entre Educação Ambiental e hipermídia, já que o desenvolvimento daquela também necessita de materiais didáticos ajustados ao seu tempo tecnológico.

Retomando as nossas colocações iniciais, pressupomos que os materiais didáticos são ferramentas úteis para a construção de saberes ambientais espacializados, sendo que os mapas interativos possibilitam inúmeras formas de apresentação dos dados, fazendo com que os usuários possam ficar mais instigados com o conteúdo, auxiliando na visualização dos dados espaciais de modo mais próximo aos atuais hábitos perceptivos da comunidade escolar, imersa no mundo multimídia, confirmando o importante papel do SIG como uma nova mídia a ser utilizada na comunicação da informação geográfica.

Consideramos, ainda, que apesar de uma série de documentos, nacionais e internacionais, definirem os conceitos, características e princípios necessários para o desenvolvimento da Educação Ambiental, o enfrentamento da temática ambiental, no ensino ainda padece de uma orientação mais definitiva.

Consideramos que a produção de um material didático que possa auxiliar a intervenção docente no sentido da construção de uma Educação Ambiental participativa e emancipatória, não está relacionada com a inserção pura e simples do lúdico ou da percepção da hipermídia como uma ferramenta cognitiva, mas sim com a forma como ela se integra a um processo de reflexão sobre o conteúdo apresentado e aos interesses do usuário.

Dessa forma, o conteúdo visual, a música e o compartilhamento das informações entre alunos-professores que a hipermídia pode propiciar, devem ser um motor propulsor para a sensibilização e a identificação dos problemas ambientais, levando à reflexão sobre a urgência da mudança dos atuais padrões de uso e distribuição dos bens ambientais.

Além disso, deve-se lembrar que os professores possuem formas próprias de entender as temáticas ambientais e de implementar o seu tratamento didático com os alunos, sendo a hipermídia uma nova estratégia educacional que pode propiciar uma inovação na sua prática didática cotidiana.

Finalmente, ressaltamos que para uma hipermídia ser realmente uma ferramenta cognitiva deve haver um ambiente contextualmente rico de aprendizagem que dê suporte aos estudantes. Apesar de poder ser projetada com o objetivo de estimular, sensibilizar o aluno à temática ambiental, a hipermídia é um programa que pode somente informar, não ocorrendo a aprendizagem pelo projeto em si, mas pelo uso que se faz por meio dela.


ARTIGO


Estudos culturais, educação e pedagogia

 Marisa Vorraber CostaI; Rosa Hessel SilveiraII; Luis Henrique SommerIII

IUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Luterana do Brasil, Programa de Pós-Graduação em Educação
IIUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Luterana do Brasil, Programa de Pós-Graduação em Educação
IIICentro Universitário Feevale, RS. Universidade Luterana do Brasil, Faculdade de Educação





RESUMO

Apresenta amplo panorama sobre o surgimento, a constituição e o desenvolvimento dos Estudos Culturais como área multifacetada de estudos que concebe a cultura como campo de luta e arena política. Suas conexões e embates com os marxismos, os feminismos e sua oposição ao racismo são focalizados, bem como suas aproximações e cruzamentos, com vertentes teóricas e tendências metodológicas. Apresenta um esboço do seu desenvolvimento na América Latina, com especial ênfase à identificação das temáticas mais abordadas e dimensões mais freqüentemente polemizadas. Ressalta, nesse caso, sua profunda imersão em questões culturais do continente, tais como a tensão local-global, a hibridação de identidades, as audiências, dentro de uma crescente multiplicidade temática. A partir do panorama desenhado, são discutidas as relações entre Estudos Culturais, educação e pedagogia, exemplificando-se com um breve esboço da pluralidade de trabalhos já realizados em nosso país dentro desse campo, assim como através de uma reflexão específica sobre a articulação entre os Estudos Culturais e a escola.

Palavras-chave: estudos culturais, educação, pedagogia

ABSTRACT

Presents a panoramic view of the emergence, the constitution and the development of Cultural Studies as a multifaceted area which conceives culture as a battlefield and political arena. The connections and clashes with Marxisms, feminisms and their opposition to racism are highlighted, as well as their approximation and crossings with theoretical issues and methodological tendencies. A sketch is made of their development in Latin America, with special emphasis on those themes and dimensions which are most frequently tackled and debated. In this case, the deep immersion in cultural issues of the continent, such as the local-global tension, the hybridisation of identities, the audiences, within an increasing thematic multiplicity are emphasised. Starting from this panorama, the close relations between Cultural Studies, education and pedagogy are discussed, presenting as an example a short review of the plurality of works already carried out in this new area in Brazil, as well as through a specific reflection on the linkage between Cultural Studies and the school.

Key-words: cultural studies, education, pedagogy





Os estudos culturais: uma introdução

O que é, afinal, Estudos Culturais? Esta frase e outras similares intitulam, no Brasil e em muitos países, alguns livros e artigos1 cujo objetivo tem sido definir os contornos da movimentação intelectual que surge no panorama político do pós-guerra, na Inglaterra, nos meados do século XX, provocando uma grande reviravolta na teoria cultural. Se continuarmos a percorrer as publicações, perceberemos, entre os textos mais disseminados, que as preocupações se concentram em problematizações da cultura, agora entendida em um espectro mais amplo de possibilidades no qual despontam os domínios do popular. Aliás, a revolução copernicana operada pelos Estudos Culturais na teoria cultural concentrou-se neste terreno escorregadio e eivado de preconceitos em que se cruzam duas noções ou concepções extremamente complexas e matizadas como cultura e popular.2

Cultura transmuta-se de um conceito impregnado de distinção, hierarquia e elitismos segregacionistas para um outro eixo de significados em que se abre um amplo leque de sentidos cambiantes e versáteis. Cultura deixa, gradativamente, de ser domínio exclusivo da erudição, da tradição literária e artística, de padrões estéticos elitizados e passa a contemplar, também, o gosto das multidões. Em sua flexão plural - culturas - e adjetivado, o conceito incorpora novas e diferentes possibilidades de sentido. É assim que podemos nos referir, por exemplo, à cultura de massa, típico produto da indústria cultural ou da sociedade techno contemporânea, bem como às culturas juvenis, à cultura surda, à cultura empresarial, ou às culturas indígenas, expressando a diversificação e a singularização que o conceito comporta.

Ao par disso, o termo popular também é objeto de uma vicejante polissemia. Do popular ao pop,3 nomeiam-se movimentações das mais variadas gamas. Popular tanto pode indicar breguice, gostos e condutas comuns do povo, entendido como a numerosa parcela mais simples e menos aquinhoada da população, quanto, na nomenclatura política das esquerdas, expressar o fetiche do mundo intelectual politicamente engajado ou mesmo as cruzadas contemporâneas em torno do politicamente correto. Nesta oscilação cambiante do significado, popular e pop comportam gradações que, com freqüência, apontam para distinções entre o que é popularesco, rebuscado, kitsch e o que é sofisticado, despojado, minimalista. Como se percebe, as palavras têm história, vibram, vivem, produzem sentidos, ao mesmo tempo em que vão incorporando nuanças, flexionadas nas arenas políticas em que o significado é negociado e renegociado, permanentemente, em lutas que se travam no campo do simbólico e do discursivo.

Os Estudos Culturais (EC) vão surgir em meio às movimentações de certos grupos sociais que buscam se apropriar de instrumentais, de ferramentas conceituais, de saberes que emergem de suas leituras do mundo, repudiando aqueles que se interpõem, ao longo dos séculos, aos anseios por uma cultura pautada por oportunidades democráticas, assentada na educação de livre acesso. Uma educação em que as pessoas comuns, o povo, pudessem ter seus saberes valorizados e seus interesses contemplados. O projeto inicial dos Estudos Culturais britânicos4 era "um projeto de pensar as implicações da extensão do termo 'cultura' para que inclua atividades e significados das pessoas comuns, esses coletivos excluídos da participação na cultura quando é a definição elitista que a governa" (Barker & Beezer, 1994, p. 12).5

Desde seu surgimento, os EC configuram espaços alternativos de atuação para fazer frente às tradições elitistas que persistem exaltando uma distinção hierárquica entre alta cultura e cultura de massa, entre cultura burguesa e cultura operária, entre cultura erudita e cultura popular. Nessa disposiçao hierárquica, ao primeiro termo corresponderia sempre a cultura, entendida como a máxima expressão do espírito humano; segundo a tradição arnoldiana,6 "o melhor que se pensou e disse no mundo". Ao segundo termo corresponderiam as [outras] culturas, adjetivadas e singulares, expressão de manifestações supostamente menores e sem relevância no cenário elitista dos séculos XVIII, XIX e XX. Harmonia e beleza eram prerrogativas da cultura, que deveria ser cultivada para fazer frente à barbárie dos grupos populares, cuja vida se caracterizaria pela indigência estética e pela desordem social e política. Só a harmonia suscitada pela "verdadeira cultura" poderia apaziguar os ânimos, aplacar a ignorância e suprimir a anarquia da classe trabalhadora parcamente instruída.

A tradição arnoldiana teve defensores arraigados no século XX, que pretenderam fazer frente ao suposto declínio cultural, à padronização da cultura e ao nivelamento por baixo prognosticado por Arnold muitas décadas antes. Diante do risco do "irremediável caos" que representariam os "temíveis avanços da cultura de massa", chegou a ser publicado um manifesto propondo introduzir nos currículos escolares um treinamento de resistência à cultura de massa, qualificada como uma cultura comercial consumida por uma maioria ignorante e inculta. Contra isso, pretendiam criar postos avançados em escolas e universidades, nas quais grupos seletos de intelectuais atuariam como "missionários" em defesa da "verdadeira cultura!" É, então, a essa concepção elitista - em que cultura é um certo "estado cultivado do espírito", que estaria em oposição "à exterioridade da civilização"- que os EC vão se contrapor.7

Os trabalhos precursores dos EC, apesar de não serem unívocos em suas perspectivas de problematização, estão unidos por uma abordagem cuja ênfase recai sobre a importância de se analisar o conjunto da produção cultural de uma sociedade - seus diferentes textos8 e suas práticas - para entender os padrões de comportamento e a constelação de idéias compartilhadas por homens e mulheres que nela vivem. Em seus desdobramentos, os EC investem intensamente nas discussões sobre a cultura, colocando a ênfase no seu significado político.

John Frow e Meaghan Morris (1997), autor e autora australianos, referem-se à cultura "não como uma expressão orgânica de uma comunidade, nem como uma esfera autônoma de formas estéticas, mas como um contestado e conflituoso conjunto de práticas de representação ligadas ao processo de composição e recomposição dos grupos sociais"(p. 345). Por sua vez, Stuart Hall (1997a e 1997c) diz que na ótica dos EC as sociedades capitalistas são lugares da desigualdade no que se refere a etnia, sexo, gerações e classes, sendo a cultura o locus central em que são estabelecidas e contestadas tais distinções. É na esfera cultural que se dá a luta pela significação, na qual os grupos subordinados procuram fazer frente à imposição de significados que sustentam os interesses dos grupos mais poderosos. Nesse sentido, os textos culturais são o próprio local onde o significado é negociado e fixado.

Analistas contemporâneos da cultura chamam a atenção para a ocorrência de uma "revolução cultural", ao longo do século XX, na qual os domínios do que costumamos designar como cultura se expandiram e diversificaram de uma forma jamais imaginada. A cultura não pode mais ser concebida como acumulação de saberes ou processo estético, intelectual ou espiritual. A cultura precisa ser estudada e compreendida tendo-se em conta a enorme expansão de tudo que está associado a ela, e o papel constitutivo que assumiu em todos os aspectos da vida social. Essa centralidade da cultura - ressaltada, entre tantos pensadores, por Stuart Hall, Fredric Jameson, Néstor Canclini, Beatriz Sarlo, David Harvey - tem uma dimensão epistemológica, que vem sendo denominada "virada cultural", referindo-se a esse poder instituidor de que são dotados os discursos circulantes no circuito da cultura. Um noticiário de televisão, as imagens, gráficos etc. de um livro didático ou as músicas de um grupo de rock, por exemplo, não são apenas manifestações culturais. Eles são artefatos produtivos, são práticas de representação, inventam sentidos que circulam e operam nas arenas culturais onde o significado é negociado e as hierarquias são estabelecidas. Para Hall (1997b),

[...] a cultura é agora um dos elementos mais dinâmicos - e mais imprevisíveis - da mudança histórica do novo milênio. Não devemos nos surpreender, então, que as lutas pelo poder deixem de ter uma forma simplesmente física e compulsiva para serem cada vez mais simbólicas e discursivas, e que o poder em si assuma, progressivamente, a forma de uma política cultural. (p. 20)

Haveria duas importantes determinantes históricas para a emergência e o desenvolvimento dos EC (Schwarz, 2000, p. 48-49). A primeira seria a reorganização de todo o campo das relações culturais em decorrência do impacto do capitalismo no surgimento de novas formas culturais - TV, publicidade, música rock, jornais e revistas de grande tiragem e circulação - que levam à dissolução o campo de forças do poder cultural das elites. A segunda teria sido o colapso do império britânico, cujo mapa territorial do poder diminui significativamente após a guerra contra o Egito em 1956, revirando o imaginário social da Inglaterra. Nessa experiência comum do fim do Império, a migração dos colonizados para sua "casa imaginada" - a Inglaterra - coloca em primeiro plano as preocupações políticas com as questões coloniais, sendo que alguns dos intelectuais que contribuíram para esse redirecionamento das discussões culturais foram formados na tradição britânica fora da própria Inglaterra.9 Surge uma nova geração intelectual com novos posicionamentos, idéias e críticas. Para Schwarz (2000), os Cultural Studies, na Inglaterra, foram uma "resposta directa à larga renarrativização da Inglaterra" (p. 49). Sua leitura vai mais adiante, contestando uma certa visão que coloca esses estudos como algo autóctone, que teria emergido de uma matriz centralizadora britânica. De fato, diz ele, muitos dos líderes intelectuais deste projeto eram periféricos a esta matriz.

Assim, a queda dos impérios coloniais e os novos contornos da cultura no capitalismo teriam marcado acentuadamente o surgimento destas movimentações na teoria cultural. O mais antigo movimento dos estudos culturais teria surgido de uma variante paroquial e provinciana. As obras The uses of literacy (Richard Hoggart, 1957), Culture and Society (Raymond Williams, 1958), The long revolution (Williams, 1961) e The making of the english working class (E. P. Thompson, 1963) foram todas anteriores à disseminação da eletricidade como principal forma de energia e a conseqüente popularização de aparatos tecnológicos que iriam transformar radicalmente o acesso à informação e à comunicação. Hoggart só teria adquirido um aparelho de televisão após ter publicado The uses of literacy (Schwarz, 2000). Mesmo nesta fase, não se pode dizer que os EC estavam centrados em torno dos mesmos propósitos, projetos teóricos e políticos ou perspectivas analíticas. De fato, eles teriam sido uma tentativa de reordenar as concepções de classe e cultura, focalizando-as no simbólico e no vivido e tentando associar as culturas vivas ao poder. Muitas foram as incorporações em termos de formas de estudo e perspectivas teóricas, inclusive com repercussões no marxismo, passando as relações de classe a serem vistas como constituídas dentro e fora do local de trabalho, na cultura. A questão do poder foi remetida para o centro das discussões; se ele não estava nas estruturas do capital, precisava ser problematizado na linguagem, no simbólico, no inconsciente. Todo esse ecletismo resultou proveitoso, remexeu as tradições intelectuais e permitiu que novos desafios fossem formulados e enfrentados (Schwarz, 2000).

Os Estudos Culturais não constituem um conjunto articulado de idéias e pensamento. Como dizem seus cronistas mais contundentes, eles são e sempre foram um conjunto de formações instáveis e descentradas. Há tantos itinerários de pesquisa e tão diferentes posições teóricas que eles poderiam ser descritos como um tumulto teórico. Para Stuart Hall- uma de suas figuras mais proeminentes e um dos mais conhecidos analistas contemporâneos da cultura - os Estudos Culturais se constituíram como um projeto político de oposição, e suas movimentações "sempre foram acompanhadas de transtorno, discussão, ansiedades instáveis e um silêncio inquietante" (Hall, 1996, p. 263).



Uma teoria viajante - temas, tensões, problemas e aproximações

Foi Heloisa Buarque de Holanda10 quem usou a expressão teoria viajante para referir-se aos Estudos Culturais, atribuindo-lhes um certo ethos, uma vocação para transitar por variados universos simbólicos e culturais, por vários campos temáticos e teorias, encontrando portos de ancoragem onde se deixam ficar e começam a produzir novas problematizações. Os Estudos Culturais não pretendem ser uma disciplina acadêmica no sentido tradicional, com contornos nitidamente delineados, um campo de produção de discursos com fronteiras balizadas. Ao contrário, o que os tem caracterizado é serem um conjunto de abordagens, problematizações e reflexões situadas na confluência de vários campos já estabelecidos, é buscarem inspiração em diferentes teorias, é romperem certas lógicas cristalizadas e hibridizarem concepções consagradas.

Os Estudos Culturais disseminaram-se nas artes, nas humanidades, nas ciências sociais e inclusive nas ciências naturais e na tecnologia. Eles prosseguem ancorando nos mais variados campos, e têm se apropriado de teorias e metodologias da antropologia, psicologia, lingüística, teoria da arte, crítica literária, filosofia, ciência política, musicologia... Suas pesquisas utilizam-se da etnografia, da análise textual e do discurso, da psicanálise e de tantos outros caminhos investigativos que são inventados para poder compor seus objetos de estudo e corresponder a seus propósitos. Eles percorrem disciplinas e metodologias para dar conta de suas preocupações, motivações e interesses teóricos e políticos.

As contribuições de importantes pensadores sociais dos meados do século XX, como Louis Althusser e Antonio Gramsci, juntamente com as análises culturais de Raymond Williams, Richard Hoggart, Edward P. Thompson e Stuart Hall, ligados às movimentações iniciais da Nova Esquerda, ajudaram a forjar a primeira linhagem de análises culturais contemporâneas identificadas como Cultural Studies. Hall (1996) relata associações dos EC com o surgimento da primeira Nova Esquerda britânica, num momento de desintegração de um certo tipo de marxismo, aquele que se desmantelava diante da visão dos tanques soviéticos invadindo Budapest, em 1956, e transformando em cacos um projeto histórico-político. Boa parte daqueles que participaram do surgimento da Nova Esquerda pretendiam juntar estes fragmentos para recompor a agenda do marxismo como projeto político e trabalhar relativamente àquelas questões que ainda importavam e que poderiam significar contribuições importantes a um projeto como o dos EC. Assim, diz Hall (idem, p. 265), trabalhava-se o marxismo, trabalhando contra ele e com ele para tentar desenvolvê-lo.

Como concordam vários autores (Angela McRobbie, Cary Nelson, Lawrence Grossberg, Paula Treichler, Richard Johnson, Stuart Hall e outros/as), os Estudos Culturais de origem britânica têm sido um terreno conturbado de discussões e desencontros. Sardar e Van Loon (1998, p. 52) apresentam um apanhado das críticas, que contestam seu paroquialismo e anglocentrismo, sua ênfase nas questões de classe (em sua fase inicial), em detrimento de raça e gênero, e sua abordagem preferencial das expressões urbanas metropolitanas e dos rituais das assim chamadas subculturas. Os EC teriam erigido a cultura popular britânica como modelar, compartilhando, mais uma vez, uma noção de arte particularmente eurocêntrica em que são celebradas as formas de arte popular britânicas. Apesar de seu propalado discurso em defesa dos excluídos e marginalizados, são acusados de manterem-se enredados numa tradição que persiste ligada à supremacia da cultura e da civilização ocidental. Além disso, apesar de se ocuparem de questões da classe trabalhadora, das mulheres, dos negros e outras minorias, eram presunçosa e exclusivamente homens brancos de classe média que militavam nesse empreendimento inicial.

Este criticismo permite situar alguns impasses na constituição do que é identificado por Hall (1996) como o legado teórico dos estudos culturais.11 De acordo com a visão deste pesquisador, expressa no trabalho mencionado, não se trata de comentar o êxito ou a utilidade dos distintos posicionamentos teóricos, e sim, de discutir questões que dizem respeito ao relacionamento entre teoria e política. Os EC podem ser tomados como uma formação discursiva no sentido foucaultiano. Eles "abarcam discursos múltiplos bem como numerosas histórias distintas. Compreendem um conjunto inteiro de formações, com as suas diferentes conjunturas e momentos no passado. [...] foram construídos por metodologias e posicionamentos teóricos diferentes, todos confrontando-se entre si" (p. 263). Para Hall, os embates dentro dos EC foram cruciais para testá-los nas arenas culturais de um mundo moderno que se esvai e de novas ordens que se instalam.

As aproximações iniciais com uma prática crítica marxista demonstraram, desde o início, argumenta Hall (idem), os desencaixes, pois era evidente sua insuficiência para dar conta de questões que eram objeto privilegiado dos EC, como cultura, ideologia, a linguagem e o simbólico. Além disso, a ortodoxia, o caráter doutrinário, o determinismo, o reducionismo, a imutável lei da história, o estatuto de metanarrativa e um inequívoco eurocentrismo seriam também incongruentes com boa parte do que já se pensava e pretendia naquele momento (décadas de 1950 e 1960). Envolver-se com o marxismo significou mergulhar em um problema. A uma certa altura, o que se fez no Centro de Estudos Culturais Contemporâneos de Birmingham,12 durante cinco ou seis anos, foi estudar tradições de pensamento que teriam contribuído para forjar o marxismo com o objetivo de procurar superar os limites que ele impunha. Quando o próprio Hall se aproximou da obra de Gramsci, isto teria se dado na medida em que o pensador italiano procurava saídas àquilo que a teoria marxista não respondia. E, nesse sentido, Hall não deixa de destacar o quanto a contribuição de Gramsci foi importante no que diz respeito à discussão de algumas questões que interessam ao estudo da cultura, despontando, entre elas, a extremamente produtiva metáfora da hegemonia. (Hall, 1996, p. 267).

Sob a ótica de Johnson (1999), apesar da crítica ao velho marxismo ter sido uma constante, tanto nas vertentes literárias quanto nas vertentes históricas dos EC, há inegáveis contribuições:

A primeira é que os processos culturais estão intimamente vinculados com as relações sociais, especialmente com as relações e as formações de classe, com as divisões sexuais, com a estruturação racial das relações sociais e com as opressões de idade. A segunda é que cultura envolve poder, contribuindo para produzir assimetrias nas capacidades dos indivíduos e dos grupos sociais para definir e satisfazer suas necessidades. E a terceira, que se deduz das outras duas, é que a cultura não é um campo autônomo nem externamente determinado, mas um local de diferenças e de lutas sociais. (p. 13)

Com esta afirmação, Johnson recupera a importância das contribuições do marxismo, concordando com Hall, em que os elementos do marxismo, embora vivos e valiosos, precisam ser constantemente criticados, retrabalhados e testados em estudos detalhados. E é isto que acontece até os nossos dias.

Outro embate importante nos EC diz respeito aos ataques advindos do movimento feminista e das lutas contra o racismo (Hall, 1996; Johnson, 1999). Essa expressão - ataque - caracteriza o sentido e os contornos dessa movimentação relativamente aos EC na década de 1970.

Segundo Hall (1996, p. 269), o caráter sexuado do poder tornou-se evidente quando, em virtude do expressivo crescimento e importância do movimento feminista no cenário dos anos de 1960 e 1970, o grupo masculino majoritário do Centro de Birmingham pensava que estava na hora de incorporar um bom trabalho feminista nos EC. Contudo, as mulheres invadiram o campo dos EC de forma intempestiva, repudiando qualquer promoção masculina relativamente ao seu ingresso. Isto, diz Hall, foi uma experiência inusitada, inesperada e radicalmente diferente, que o confrontava com a materialidade da noção foucaultiana de saber-poder. Em vez da planejada desistência do poder, os homens "transformados" e bonzinhos que abriam as portas às mulheres estavam sendo silenciados, tomados de assalto, contestados ruidosamente, além de expostos em suas ligações inequívocas com o arraigado poder patriarcal. Desde então, a crítica feminista nos EC tem produzido parte significativa das análises culturais que afetam os modos como as mulheres vêm ocupando espaços e sendo reposicionadas nas políticas culturais.13

No que diz respeito à questão racial, as lutas internas nos EC não foram diferentes. Os estudos, hoje numerosos e vicejantes, sobre questões críticas de raça e racismo, são resultantes de um longo, amargo e contestado combate interno contra um silêncio retumbante e prolongado em torno desse ponto. Para Hall (1996), isto pode ser melhor compreendido se situado numa conjuntura arraigadamente britânica, e a retardada saída deste impasse tem conexões com as renhidas lutas da Nova Esquerda e suas discordâncias com o marxismo. Aqueles que se empenharam em produzir estudos voltados para esta questão enfrentaram imensa dificuldade para criar o espaço teórico e político necessário ao desenvolvimento desse projeto.14

Outro campo polêmico, em ebulição desde os primórdios dos EC, é aquele constituído pelo que tem sido criticamente denominado de ortodoxia teórica do textualismo. Hall (1996) ressalta as repercussões da virada lingüística para os EC, com suas conseqüentes ênfases nas noções de discurso e texto, tomados agora em seu caráter produtivo e constitutivo da experiência cotidiana, das visões de mundo e das identidades. Segundo ele, também em relação a este tópico travou-se uma luta interna nos EC britânicos, cujos desdobramentos certamente legaram um saldo positivo tanto em termos de debates teóricos e compreensão da teoria quanto no que diz respeito à produtividade destas noções nas problematizações da cultura. O confronto nada tranqüilo entre trabalhos de cunho estruturalista, semiótico e pós-estruturalista, bem como os embates entre estes e as tradições de pensamento de vários matizes que inspiravam as análises do campo, não impedem, contudo, que se deixe de reconhecer:

A importância crucial da linguagem e da metáfora lingüística para qualquer estudo da cultura; a expansão da noção de texto e textualidade, seja como fonte de significado, seja como aquilo que elide ou adia o significado; o reconhecimento da heterogeneidade, da multiplicidade dos significados, do esforço envolvido no fechamento arbitrário da semiose infinita para além do significado; o reconhecimento da textualidade e do poder cultural, da própria representação, como sítio de poder e de regulamentação; do simbólico como fonte de identidade. (Hall, 1996, p. 271)

Hall argumenta ainda que as conseqüências da virada lingüística para os EC far-se-ão sentir ainda por longo tempo, reconfigurando as teorias, por ser preciso, agora, "pensar as questões da cultura através das metáforas da linguagem e da textualidade" (p.271). Isso representa um adiamento necessário, um deslocamento inevitável, pois há sempre algo que escapa, descentrado, perdido no meio da cultura, na linguagem, nos textos, nos discursos, na significação, e esse algo pode ser o elo para localizar uma fonte de poder, aquilo que produz o significado a favor ou contra tal ou qual política.

Quando se assume que a cultura opera através das suas textualidades, o grande desafio de um projeto político como o dos EC, que "tenta desenvolver-se como uma espécie de intervenção teórica coerente" (idem, ibidem), é conseguir um registro teórico que dê conta disto. Parece que a saída é aprender a viver em uma tensão constante, testando permanentemente a vitalidade das teorias em confrontos com as materialidades de suas práticas cotidianas. Viver nessa tensão é o preço de não abdicar de pretensões intervencionistas. A exclusiva prática intelectual é tranqüila. Atribulada, incerta, instável e cambiante é a prática intelectual como política.

Tudo isso faz com que seja muito difícil, senão impossível, chegar-se a alguma precisão ou consenso relativamente a uma caracterização dos Estudos Culturais. Eles são muitas coisas ao mesmo tempo, tensionando os panoramas intelectuais e acadêmicos em que estão implicadas tanto as velhas e consagradas disciplinas como os movimentos políticos, práticas acadêmicas e modos de investigação tais como o marxismo, o pós-colonialismo, o feminismo, o pós-estruturalismo. Esse é o motivo pelo qual são freqüentemente descritos como uma antidisciplina ou pós-disciplina.

Hall (1996) diz que, apesar de o projeto dos EC caracterizar-se pela abertura, recusar-se a ser uma metanarrativa ou um metadiscurso, ou consistir num projeto aberto ao desconhecido, ao inominável, não se pode reduzi-lo a um pluralismo simplista. De acordo com Sardar e Van Loon (1998), toda esta dificuldade para definir os Estudos Culturais não significa que "qualquer coisa pode ser estudos culturais, ou que estudos culturais podem ser qualquer coisa" (p. 9). Há, segundo estes dois autores, pelo menos cinco pontos distintivos dos EC. O primeiro é que seu objetivo é mostrar as relações entre poder e práticas culturais; expor como o poder atua para modelar estas práticas. O segundo é que desenvolve os estudos da cultura de forma a tentar captar e compreender toda a sua complexidade no interior dos contextos sociais e políticos. O terceiro é que neles a cultura sempre tem uma dupla função: ela é, ao mesmo tempo, o objeto de estudo e o local da ação e da crítica política. O quarto é que os EC tentam expor e reconciliar a divisão do conhecimento entre quem conhece e o que é conhecido. E o quinto, finalmente, refere-se ao compromisso dos EC com uma avaliação moral da sociedade moderna e com uma linha radical de ação política.



Os Estudos Culturais na América Latina15

Alasuutari (1999) faz referência ao "carisma dos estudos culturais", que teriam se espalhado por quase todo o mundo, e procura caracterizá-los da seguinte forma: "Eles têm crescido e se expandido não simplesmente através das pessoas que trabalham adotando os conceitos da Escola de Birmingham, mas principalmente porque essas pessoas se identificam com os EC"(p. 92, grifos nossos). Neste sentido - o da identificação de sujeitos e grupos de diferentes países com a atmosfera intelectual e as propostas investigativas dos EC - certamente têm atuado algumas condições marcantes da pós-modernidade, como as instabilidades do mundo contemporâneo, a desintegração das narrativas mestras que o explicavam, as inúmeras rupturas com a ordem estabelecida, a intensa conexão planetária favorecida pela mídia, as novas questões trazidas por inéditas formas de migração e desterritorialização, condições às quais os EC parecem corresponder, produzindo encaixes temporários, porém fecundos.

Inúmeros países têm "ancorado" EC,16 e isto não se deve, necessariamente, a uma migração dos EC britânicos. Parece que as conexões entre os estudos que revolucionam a teoria cultural contemporânea podem ser atribuídas, primordialmente, à amplitude e abrangência destas movimentações no cenário de um mundo que se torna transparente. A expressão "sociedade transparente", utilizada por Gianni Vattimo (1991) para atribuir sentido ao pós-moderno, diz respeito ao fato de vivermos em uma sociedade de comunicação generalizada, massificada, onde tudo se torna visível, de variados ângulos e sob inúmeras versões. Segundo o autor, o desenvolvimento vertiginoso das tecnologias da comunicação e da informação - jornais, rádio, televisão, informática e afins- estaria associado às crises do colonialismo e do imperialismo europeu, e teria contribuído radicalmente para a dissolução de pontos de vista centrais, tornado impossível a manutenção de uma concepção de história como curso unitário em direção ao progresso.

Os Estudos Culturais na América Latina têm sido marcados simultaneamente por um grande florescimento e uma não menos expressiva quantidade de polêmicas, críticas e negações de sua legitimidade, sua relevância e seu status acadêmico. A existência, facilmente comprovável por incursões na Internet, de centros universitários e de pesquisa, e de programas de mestrado e doutorado que focalizam os Estudos Culturais (ou, mais freqüentemente, os Estudios Culturales Latinoamericanos) sinaliza tal florescimento, indicando que no Chile, na Argentina, no México, na Colômbia, no Equador, na Venezuela, no Uruguai, por exemplo, há um conjunto- ou mais, ou menos expressivo - de reflexões, estudos e iniciativas institucionais que se filiam a esses estudos.

Mesmo que sua história ainda esteja por ser escrita,17 conforme assinala Moreiras (2001, p. 355), é possível, através de um sobrevôo por suas temáticas, características e principais questões, esboçar um quadro que nos ajude a ver as formas pelas quais - em sua especificidade - eles podem ser (e têm sido, como veremos adiante) inspiradores para as reflexões em educação no espaço latino-americano.

As polêmicas iniciam pela circunscrição do que "pertenceria" aos Estudos Culturais e o que não seria específico do campo, já por si só caracterizado como teórica e metodologicamente instável. De forma paradoxal, os nomes mais constantemente associados aos Estudos Culturais na América Latina - Néstor García Canclini, Jesús Martín-Barbero e Beatriz Sarlo- não são intelectuais que se reconheçam alinhados ou se filiem aos EC de maneira inconteste. Efetivamente, os EC capitalizaram e renomearam estudos de "análise cultural" que se faziam na América Latina anteriormente, influenciando o seu desenvolvimento, como afirmam, inclusive, os dois primeiros nomes citados anteriormente. Martín-Barbero, por exemplo, declara, em entrevista prestada à revista eletrônica Dissens em 1996:

Não comecei a falar de cultura porque me chegaram coisas de fora. Foi lendo Martí,18 Arguedas19 que eu a descobri, e com ela os processos de comunicação que se tinha de compreender. [...] Nós havíamos feito estudos culturais muito antes de que essa etiqueta aparecesse.

Também Canclini, conforme Mato (2001, p. 1), teria afirmado que havia começado a "fazer Estudos Culturais" antes de se dar conta de que eles assim se chamavam. Nomeações à parte, é importante assinalar que a década de 1990 é reconhecida como a década em que ocorreu a explosão dos EC na América Latina, marcada pela realização de pesquisas sobre "consumo cultural", ora utilizando metodologias quantitativas, ora estratégias qualitativas (entrevistas e dinâmicas de grupo, por exemplo), expandindo-se por meio de estudos e publicações de ensaios de maior fôlego. Cabe registrar, ainda, no que diz respeito aos EC da América Latina, a freqüente utilização das expressões "Teoria cultural" e "análises culturais", numa superposição que torna difícil falar de fronteiras e limites rígidos em relação ao que se vem entendendo por Estudos Culturais.

Nesse sentido, se há consenso acerca da explosão dos EC na América Latina dos anos de 1990, é necessário recuar no tempo para rastrear o contexto peculiar em que eles foram gestados. Para Ríos (2002, p. 247), os EC latino-americanos podem ser definidos como "um campo de estudos configurado dentro da tradição crítica latino-americana", e, ainda que tenham significado uma ruptura epistemológica com o que antes se fazia, inserem-se em uma importante tradição do ensaio de idéias da América Latina, tradição esta que já vinha se estabelecendo desde o século XIX. Além disso, há que se citar a efervescência do panorama cultural nas décadas mais recentes, em muitos países latino-americanos, como relembra oportunamente Mato (2001, p. 13), alertando para que não percamos de vista

[...] a importância, para o campo dos estudos e outras práticas em cultura e poder, das contribuições de Paulo Freire, Orlando Fals Borda, Aníbal Quijano e numerosos intelectuais latino-americanos que mantiveram e mantêm práticas dentro e fora da academia e que, portanto, não necessariamente fazem "estudos", assim como dos diversos movimentos teatrais e ativistas teatrais (os casos de Augusto Boal e Olodum, por exemplo), o movimento zapatista no México, os movimentos e intelectuais indígenas em quase todos os países da região (mas particularmente em Chile, Bolívia, Equador, Colômbia e Guatemala), o movimento feminista, o movimento dos direitos humanos, diversos movimentos de expressões musicais (a nova canção, os rocks críticos, etc), o trabalho de numerosos humoristas (Quino, Rius, Zapata e outros) e de cineastas (novo cinema brasileiro e outros, etc.).

Se a questão das fronteiras e dos contextos que constituíram condições de possibilidades para a eclosão dos EC latino-americanos é um campo aberto para múltiplas explorações, também avultam as discussões ligadas à sua nomeação. Assim, uma de suas denominações - Latin American Cultural Studies- é objeto de discussão e contestação. Mato (2001, p. 6) entende que tal denominação os situaria nos chamados Area Studies, os quais, em sua origem, estariam associados a projetos imperiais de produção de conhecimentos sobre povos e nações dominados, conhecimentos esses produzidos para uso das metrópoles. O autor venezuelano entende que é na academia estadunidense que tem se estabelecido o cânone "válido" para os EC latino-americanos, com a sacralização de alguns autores e a consagração de uma leitura específica dos mesmos; além disso, ele expressa seu temor em relação ao que identifica como uma influência despolitizadora dos EC estadunidenses, em tópico que adiante retomaremos.

Com que dosagem os diferentes elementos da química geradora dos EC latino-americanos - a influência dos EC britânicos, estadunidenses e australianos, por um lado, uma tradição latino-americana anterior e concomitante de ensaios críticos e análises culturais, por outro - se misturaram, e com quais "resultados", não é questão fácil de responder e nem é esta aqui nossa pretensão. Entende Moreiras (2001) que "tal história também tem uma genealogia totalmente diferente, bem como condições distintas de inscrição social e intelectual" (p. 355), o que se reflete, por exemplo, em alguns temas recorrentes e diferentes negociações que os trabalhos latino-americanos farão com trabalhos de outras áreas. Como bem assinalaram Canclini e Martín-Barbero (apud Mato, 2001), o encontro entre aportes e leituras dos EC, as tradições de estudo anteriores e novas vertentes investigativas constituíram um sítio interessante para novas e instigantes produções, mesmo que sobre elas possa recair o estigma de algum sincretismo teórico e metodológico.

Em contrapartida, há que se sublinhar que, a diferença dos EC britânicos, estadunidenses e australianos, em que a circulação de textos dos diversos autores não sofreu qualquer constrangimento advindo da língua utilizada na escrita, no panorama latino-americano a questão dos idiomas que os intelectuais dominem ou não, não é uma questão menor no panorama da legitimação e disseminação do que seriam os "genuínos" EC. Mignolo (apud Mato, 2001, p. 10) observa que "o espanhol e o português são idiomas que caíram do carro da modernidade e se converteram em idiomas subalternos da academia". Isso explicaria um maior sucesso daqueles acadêmicos que, geralmente em função de cursos de pós-graduação e bolsas de estudo, exibem um significativo domínio da língua inglesa, idioma em que, por exemplo, é publicado o conhecido periódico denominado Latin American Cultural Studies. Interessante notar que - se se entende a língua como um importante marcador de identidade - um dos temas mais caros aos EC da América Latina - tal questão poderia ser considerada central à própria discussão interna dos grupos de Estudos Culturais latino-americanos, o que efetivamente não parece vir ocorrendo.

De forma similar à sua ação em outros continentes, também na América Latina os EC vêm colaborando para a implosão das linhas acadêmicas de separação das áreas disciplinares. Castro-Gómez (2000, p. 157) afirma, por exemplo, que "a vocação transdisciplinar dos estudios culturales tem sido altamente saudável para algumas instituições acadêmicas que, pelo menos na América Latina, tinham se acostumado a 'vigiar e administrar' o cânone de cada uma das disciplinas". Para Moreiras (2001, p. 74), "as disciplinas mais seriamente afetadas pela ascensão dos estudos culturais hoje" são os estudos literários, a história, a antropologia e os estudos da comunicação. Em entrevista concedida em 1994 (Canclini, 1997b, p. 79), Canclini registra a origem disciplinar diferenciada dos primeiros pesquisadores dos EC da América Latina, afirmando:

Creio que essa corrente de estudos é proveitosa no sentido de que é gerada de uma variedade de diferentes disciplinas: Brunner, da sociologia, Martín-Barbero, da comunicação e semiótica; meu próprio background é em filosofia, mas também sociologia, crítica da arte e antropologia; Sarlo, dos estudos literários, e Ortiz, antropologia e sociologia. Penso que o que temos em comum é o desejo de encontrar uma maneira melhor de estudar os processos culturais de uma forma multidisciplinar. Combinar tais abordagens é central ao projeto, uma vez que entendamos processos culturais como processos que devem ser problematizados mais como interconectados e interdependentes do que como fenômenos isolados, que é a forma como são tratados na maioria das disciplinas.



Temáticas preferenciais dos Estudos Culturais na América Latina

Como vimos, os Estudos Culturais realizados na América Latina foram impregnados pelos contextos, problemáticas e tensões vividas nos diferentes grupos e nações do continente, vindo a mesclar-se com estudos anteriores que, de certa forma, foram revigorados. Para Ríos (2002, p. 247), como os EC se ocupam da produção simbólica da realidade social latino-americana (materialidade, produções e processos),

[...] qualquer coisa que possa ser lida como um texto cultural e que contenha em si mesma um significado simbólico sócio-histórico capaz de acionar formações discursivas, pode se converter em um legítimo objeto de estudo: desde a arte e a literatura, as leis e os manuais de conduta, os esportes, a música e a televisão, até as atuações sociais e as estruturas do sentir.

Nesse sentido, pode haver uma especificidade - como efetivamente há - em muitos estudos da vertente latino-americana, mas - vistos em sua globalidade - eles se harmonizam com o desenvolvimento mais global do campo, que se propõe multitemático e polifonicamente interessado em quaisquer artefatos, processos e produtos que "signifiquem".

A contestação da diferença entre a "alta cultura" e a "baixa cultura" que caracterizou tão profundamente o campo desde o seu surgimento pode ser comparada, por exemplo, às análises que Canclini realiza das fronteiras entre "arte" e "artesanato". Enveredando pelas vielas do consumo, da produção dos chamados artistas populares e da mercantilização das tradições, que se situam na arena da peculiar "modernidade" da América Latina, Canclini observa o quanto, a um olhar "refinado" tradicional, a linha que separa a arte do artesanato popular é traçada conforme as oposições dos cânones tradicionais do "culto e popular": a arte é vista como "movimento simbólico desinteressado, um conjunto de bens 'espirituais' nos quais a forma predomina sobre a função e o belo sobre o útil", enquanto "o artesanato aparece como o outro, o reino dos objetos que nunca poderiam dissociar-se de seu sentido prático" (Canclini, 1998, p. 242); a arte, como produzida por artistas "singulares e solitários", o artesanato, por populares "coletivos e anônimos"; a arte, como referente a "obras únicas, irrepetíveis"; o artesanato, como referente a "objetos em série", reiterativos em suas estruturas. Submetendo tais oposições a uma informada e aguda crítica, o autor latino-americano questiona cada um desses parâmetros diferenciadores, e observa - numa afirmação que, de certa maneira, estampa uma diretriz constante e definidora do seu trabalho: Seria possível avançar mais no conhecimento da cultura e do popular se se abandonasse a preocupação sanitária em distinguir o que teriam a arte e o artesanato de puro e não-contaminado e se os estudássemos a partir das incertezas que provocam seus cruzamentos (idem, p. 245).

Este é, apenas, um pálido exemplo da pujança das análises que incidem sobre questões culturais da América Latina. As hibridações - o importante conceito proposto por Canclini para a análise das culturas latino-americanas, as identidades e sua fragmentação, as redes de dependências, as relações entre tradição e modernidade, as transformações das culturas populares, os consumos culturais são alguns dos núcleos temáticos mais poderosos que deram e dão fôlego ao pensamento latino-americano nomeado como EC ou lindeiro a esses.

Entre os traços comuns à maioria de tais estudos, avulta uma insistente referência às transformações da América Latina, nas últimas décadas, como decisivas para a modelagem das temáticas, metodologias e focos de tais pesquisas. São recorrentes as alusões a mudanças políticas (à derrocada dos governos militares, mais freqüentemente, com conseqüente abertura de processos de democratização), ao surgimento dos blocos econômicos (como Mercosul, por exemplo), ao declínio dos Estados-nação e de outras instituições tradicionais (religião, escola) como referentes para a identidade, ao mesmo tempo em que se alude à crescente e avassaladora presença da mídia em todos os estratos da população, às transformações do lugar da mulher no âmbito público e privado latino-americano, a questões como a das populações indígenas e mudanças de enfoque de sua problemática, assim como a atenção a atores sociais com relevância cultural mais recentemente atribuída, como é o caso dos jovens, isso, sem falar nas novas preocupações com as questões urbanas, entendendo-se as cidades como sítios privilegiados da produção de significados culturais no fim do século XX e início do XXI.

Nesse sentido, um projeto levado a efeito pelo Centro de Estudios Culturales da Universidade do Chile, cujo delineamento encontra-se disponível na Internet,20 é exemplar pela riqueza de sua trama conceitual e caráter revisor das questões que têm preocupado os EC da América Latina. Denominado Identidades en América Latina: discursos y prácticas, o projeto, contando com uma equipe multidisciplinar, coloca questões que - descontada sua particularização à nação chilena - poderiam ser entendidas como atravessando em grande escala os EC latino-americanos. São elas: Quais são os atuais discursos que sustentam e/ou fraturam as identidades no Chile? Que identidades articulam e expressam? Que identidades excluem? Quais são suas coordenadas epistêmicas, éticas e sócio-históricas? Quais são seus espaços de produção e circulação? Quais são seus dispositivos, estratégias e políticas culturais?

Explorando um pouco a potencialidade de tais questões, confrontadas com a pujante produção dos EC latino-americanos, poder-se-ia enfatizar o lugar do "indígena" na questão das identidades latino-americanas como um dos grandes eixos inspiradores de trabalhos, assim como, já do ponto de vista da área da Comunicação, a questão do consumo cultural dos produtos da mídia. Tanto uma como outra questão se confrontam na tensão global x local, também presente em significativo número de obras "fundadoras" e estudos acessíveis ao leitor brasileiro.21

Em relação ao primeiro tópico, perspicazes análises sobre a impossível pureza do indígena (expressão de Martín-Barbero) são levadas a efeito por vários autores, como os já citados Sarlo, Canclini e Martín-Barbero. Contrapondo-se às visões românticas que viam no índio o "único traço que nos resta da autenticidade", o "lugar secreto onde subsiste e se conserva a pureza de nossas raízes culturais" (Martín-Barbero, 1997a, p. 260), o estudioso procura pensá-lo dentro do espaço político e teórico do "popular", nem visto como externo ao desenvolvimento capitalista, nem como simples molusco engolido por sua voragem. Nessa direção, as pressões exercidas pelo consumo, pelo mercantilismo, pelo discurso do exotismo e do rústico, dentro do cenário mais amplo de um turismo que é, principalmente, fonte de sobrevivência, não podem ser negadas nem demonizadas.

Enfim: tematicamente os EC da América Latina têm mergulhado nos processos e artefatos culturais de seus povos, na cotidianidade das suas práticas de significação, na contemporaneidade de um tempo em que as fronteiras entre o global e o local se relativizam, se interpenetram e se modificam. Um exame dos sumários de obras publicadas, seminários, jornadas e revistas que têm abrigado trabalhos de EC nos aponta uma variedade temática que congrega, por exemplo, dentro do campo mais amplo da cultura popular urbana, a questão das culturas dos bairros populares, os graffiti, a apropriação e a reelaboração musical, o rock e as subculturas juvenis etc. Conforme Follari (2000, p. 5), encontramos, nos EC da América Latina,

[...] textos de uma capacidade previamente insuspeitada para amplificar o olhar sobre o mundo do microssocial e dos fenômenos de constituição e modificação das identidades; sobre as modalidades de agrupamento e de associação; sobre os procedimentos de produção e de consumo cultural; sobre a invenção das tradições e configuração da autocompreensão promovidas pelos estados nacionais.



Algumas discussões - os Estudos Culturais na América Latina e a pós-modernidade

Por outro lado, uma questão como as relações entre os EC e a pós-modernidade também está no fulcro dos debates, uma vez que - em certos círculos - os Estudos Culturais teriam aparecido como "o âmbito específico e exclusivo da discussão relativa ao tema pós-modernidade - ao menos para muitos analistas teóricos e grupos de leitores" (idem, p. 2). Em interessante discussão sobre a presença ou ausência das discussões mais filosóficas da pós-modernidade dentro dos EC realizados na América Latina, o citado autor (2000)22 observa que não encontra dentro dos mesmos uma discussão aprofundada ou demorada, de cunho filosófico, sobre a pós-modernidade. Para usar suas palavras:

[...] nada disso [referências a Nietzsche, Heidegger, Derrida, Vattimo, Baudrillard, Lipovetski] aparece nos estudos culturais e isso é simplesmente porque esses últimos são estudos do que há no pós-moderno, mas não "sobre" o pós-moderno. São estudos sobre identidades, sobre comunicação, sobre teoria literária e sua relação com a cultura ou sobre os modos de constituição do nacional ou do internacional/compartilhado. Porém seu objeto explícito não é o moderno/pós-moderno, mas a cultura contemporânea, a qual está, obviamente, atravessada pelos efeitos da passagem do moderno ao pós-moderno. (p. 7)

O referido autor efetua um detido exame das superposições, encontros e desencontros das reflexões sobre a pós-modernidade e as realizadas pelos EC na América Latina. Para ele, "o pós-moderno não se entende sem os Estudos Culturais nem se entende somente com eles", assinalando também a fecundidade das temáticas que os EC trouxeram para exame, temáticas que não haviam aflorado em autores "filosóficos". As temáticas do tempo presente, como a bastante explorada questão da cultura juvenil, das bandas de rock, do fanatismo esportivo, ou da música salsa, trazidas à boca de cena pelos estudos culturais (embora não apenas por estudos que, nominalmente, se filiem a eles) na América Latina, revitalizaram a reflexão sobre as contingências, articulações e buscas de compreensão da pós-modernidade em nosso continente.

Em contrapartida, alguns desenvolvimentos "filosóficos" relativos à pós-modernidade que cobrem importantes aspectos teóricos, como o status do pós-moderno, a relação com a modernidade, com o modernismo, com a modernização, com as temáticas do sujeito e das ciências, ou não são tematizados nos trabalhos de EC ou o são apenas de passagem (Follari, 2000, p. 6). Para o autor, efetivamente se observa uma certa exterioridade de cada campo em relação ao outro- um se debruçando sobre a cultura do pós-moderno e outro propondo uma teorização específica sobre a pós-modernidade; ultrapassar tal alheamento mútuo, observa ele, ensejaria um "mútuo fecundamento conceitual".

Alguns questionamentos relativos aos EC na América Latina parecem advir justamente do entendimento de que eles deveriam propor um entendimento universalizante, ou melhor, parecem resultar da percepção do visceral enlace dos EC com os discursos da fragmentação e relativismo típicos da pós-modernidade. Neste sentido, vale a pena dar voz às inquietações de Canclini (1997a):

Quando menciono paradigmas ou modelos não estou regressando ao cientificismo que postulava um saber de validade universal, cuja formalização abstrata o tornaria aplicável a qualquer sociedade e cultura. Mas tampouco me parece satisfatória a complacência pós-moderna que aceita a redução do saber a narrativas múltiplas. Não vejo por que abandonar a aspiração de universalidade do conhecimento, a busca de uma racionalidade interculturalmente compartilhada que dê coerência aos enunciados básicos e os contraste empiricamente. Foi esse tipo de trabalho que colocou de forma clara que diferentes culturas possuem lógicas e estratégias diferentes para ter acesso ao real e validar seus conhecimentos, mais intelectuais em alguns casos, mais ligadas à sensibilidade" e à "imaginação" em outros.

De certa maneira, as preocupações citadas anteriormente - que certamente ecoam entendimentos modernos de conhecimento - vão se articular, no desenvolvimento da argumentação de Canclini, a preocupações que se conectam com o caráter político dos EC, em que o próprio autor será objeto de ataques. Acompanhemos sua exposição, em que o apelo à racionalidade (moderna?) também se faz presente:

Creio que o relativismo antropológico que fica em um reconhecimento desierarquizado de tais diferenças mostrou limitações suficientes para que nele nos instalemos. A necessidade de construir um saber válido interculturalmente se torna mais imperiosa em uma época em que as culturas e as sociedades se confrontam todo o tempo nos intercâmbios econômicos e comunicacionais, nas migrações e no turismo. Precisamos desenvolver políticas cidadãs que se baseiem em uma ética transcultural, sustentada por um saber que combine o reconhecimento de diferentes estilos sociais com regras racionais de convivência multi-étnica e supranacional. (idem, ibidem)

Efetivamente, coexistem no pensamento deste que é um dos mais importantes autores dos EC latino-americanos23 a constante busca de negação de certos eixos da compreensão moderna de mundo - a negação das totalidades marxistas, por exemplo - com a procura de um ponto de sustentação que justifique não apenas análises culturais das diferenças, mas também a condenação das desigualdades tão manifestamente expostas na contemporaneidade da América Latina. De maneira mais geral ainda, Canclini (1997a, p. 2), em texto em que aborda o "mal estar dos estudos culturais", aponta como uma das fragilidades de seu desenvolvimento na América Latina a falta de uma mais consistente reflexão teórica e epistemológica, alertando para o risco de uma "aplicação rotineira de uma metodologia pouco disposta a questionar teoricamente sua prática" e sugerindo um esforço maior nesse sentido.



Outra discussão: a despolitização da teoria e da pesquisa

Também no caso dos Estudos Culturais latino-americanos se fazem ouvir vozes que criticam a alegada renúncia ao caráter político do campo, mesmo que elas atinjam autores e obras que não tenham abandonado a intenção de uma ação política "transformadora". Tomando como exemplo um dos livros considerados centrais no campo - Consumidores e cidadãos -, pode-se resgatar a crítica mais comum ao mesmo, a qual consiste na não-aceitação do nosso status de habitantes da contemporaneidade como meros consumidores em vez de legítimos cidadãos. Follari (2000, p. 2) aponta a leitura dessa obra e de outras dos EC latino-americanos vendo-as como cúmplices de um caráter "adaptacionista" dos Estudos Culturais. O slogan de Canclini, em Consumidores e cidadãos - "O consumo serve para pensar" - certamente foi um dos dispositivos motivadores de algumas dessas contestações. Já na via inversa dessa crítica à despolitização dos estudos culturais, Martín-Barbero propõe uma reflexão que ultrapasse os velhos cacoetes de uma esquerda apenas preocupada com as ações reivindicatórias dos grupos "oprimidos" e de suas ações de organização de classe, de uma esquerda que vê as práticas do viver cotidiano mais como um "obstáculo à tomada de consciência do que como ação política conseqüente" (Martín-Barbero, 1997a, p.289). E assevera (p. 290):

O consumo não é apenas reprodução de forças, mas também produção de sentidos: lugar de uma luta que não se restringe à posse dos objetos, pois passa ainda mais decisivamente pelos usos que lhes dão forma social e nos quais se inscrevem demandas e dispositivos de ação provenientes de diversas competências culturais.

Também é freqüente, em um continente onde o pensamento social freqüentemente buscou força nos ditames marxistas e críticos, a emergência de um certo desconforto em relação ao abandono, pelos EC, de explicações ou totalizantes ou alinhadas ao discurso da "libertação". Nesse diapasão, Castro-Gómez (2000, p. 158), entendendo que a cultura urbana de massa e as novas tecnologias da informação têm sido vistas nos EC latino-americanos como "espaços de emancipação democrática", levanta a suspeita de que os estudos culturais teriam "hipotecado seu potencial crítico à mercantilização fetichizante dos bens simbólicos". E mais: o crítico atribui aos EC latino-americanos um novo tabu - o da abordagem da "totalidade", seduzidos que estariam pela fragmentação do sujeito, pela hibridação das formas de vida, pela articulação das diferenças e pelo desencanto diante das novas metanarrativas. Não se trata, para o autor, de reabilitar as velhas dicotomias da teoria crítica - colonizador x colonizado, centro x periferia, opressor x oprimido, centro x periferia - mas, sim, de tornar visíveis os "novos mecanismos de produção das diferenças em tempos de globalização", através de uma "descolonização" das ciências sociais e da filosofia.

Outra inconformidade alinhada ao pretenso caráter despolitizante dos EC diz respeito à elisão do conceito de classe social, tão caro às teorias críticas. Verdesio (2003, p. 4) assim sintetiza tal crítica em relação aos mesmos:

A apropriação do popular [...] se deve, entre outras coisas, à incorporação a um modelo teórico que quer ver nelas [produções da cultura popular] uma confirmação, na maioria dos casos, da falácia seguinte: na pós-modernidade, por fim, os marginalizados podem se expressar. Entretanto, todas essas celebrações perdem de vista, sistematicamente, as questões de classe. Quero dizer que os estudos culturais, em geral, tendem a deixar de lado qualquer análise de classe possível. E isto, em sociedades tão desiguais como as latino-americanas, se parece mais com um pecado do que com um erro de perspectiva.

De qual lado estariam os argumentos mais poderosos é uma questão cuja resposta dependeria de uma incursão mais demorada, inadequada às dimensões deste artigo.



Apontamentos finais sobre Estudos Culturais na América Latina

Em interessante entrevista dada por Canclini a Patrick D. Murphy (Canclini, 1997b), o autor argentino-mexicano traz algumas informações que podem enriquecer este breve esboço dos EC na América Latina. Uma das questões colocadas pelo entrevistador, com respeito à perspectiva feminista dentro dos EC da América Latina, é respondida por Canclini através da marcação da diferença entre o feminismo americano e os estudos sobre mulher na América Latina, além de reconhecer que, efetivamente, esse enlace poderia ser mais forte no caso dos EC latino-americanos. Com respeito às influências da Escola de Birmingham na formação dos EC do continente, Canclini a reconhece, em certa medida, nos estudos de comunicação, e também aponta a existência de outras fortes influências não diretamente associadas aos EC, como a de Pierre Bourdieu, cuja importância, diz Canclini, não tem sido oficialmente reconhecida. Por fim, quando questionado sobre diferentes leituras do pós-modernismo pelos escritores latino-americanos e pelos ensaístas clássicos, (como Jameson, Baudrillard e Lyotard), Canclini aponta algumas diferenças (Canclini, 1997b, p. 87):

Na América Latina um conjunto de distintas circunstâncias políticas impregna a articulação cultural; isto é, existem diferentes formas nas quais modos tradicionais de vida são articulados com os processos de modernização. A esse respeito, os escritores latino-americanos têm mostrado uma elevada sensibilidade para reconhecer formações culturais que não são necessariamente "modernas"; a memória popular é um importante elemento que contribui para a mudança das culturas contemporâneas.

As transações entre os EC dos países americanos de língua espanhola e o Brasil, exceção feita a Canclini, Martín-Barbero e Beatriz Sarlo, têm sido tímidas e incipientes, possivelmente em função de certas dificuldades históricas de tal relacionamento, por parte da intelectualidade brasileira, que, no caso específico, se tem abeberado nas leituras dos autores ingleses, americanos e australianos, ora lidos em traduções publicadas, ora em traduções "preliminares", ora no original. Mas a dificuldade de acesso à bibliografia latino-americana publicada nos diferentes países latino-americanos sobre EC também desempenha seu papel neste distanciamento; enquanto os lançamentos sobre EC em língua inglesa são pronta e expeditamente disponibilizados nas livrarias virtuais e grandes editoras de língua inglesa, idêntico sistema na América Latina é precário e, em alguns países, inexistente. Também a leitura de trabalhos latino-americanos de EC aponta para um tímido aproveitamento dos estudos brasileiros, exceção feita à produção de Renato Ortiz, celebrada pelos autores latino-americanos já citados.

Por fim, há que se assinalar que os EC não têm sido, na América Latina, apenas um manancial de estudos e de polêmicas; institucionalizados em grande medida, eles também já constituem "tema de cursos", inclusive na Internet. Nesta esteira, o Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales (CLACSO) programa para o ano de 2003 um curso à distância sobre "Los Estudios Culturales en Latinoamerica", do qual disponibiliza aos internautas interessados um plano de estudo, de que pinçamos um trecho por seu poder de síntese em relação ao campo cultural que é focalizado por tais estudos na América Latina (Los estudios, p. 2):

No nível de conteúdos temáticos, a cultura que os estudos culturais "criam" não é a mesma que haviam criado, anteriormente, a antropologia, a sociologia, a economia ou as humanidades. [...] A cultura que os Estudos Culturais "estudam" tem menos a ver com os artefatos culturais em si mesmos (textos, obras de arte, mitos, valores, costumes, etc) do que com os processos sociais de produção, distribuição e recepção desses artefatos. Ao mesmo tempo, os estudos culturais privilegiam o modo no qual os próprios atores sociais se apropriam desses imaginários e os integram a formas locais de conhecimento.



Estudos culturais em educação: que território é este?

A IV Conferência Internacional Crossroads in Cultural Studies,24 realizada em Tampere, na Finlândia, em julho de 2002, com o propósito de ser um fórum aberto às temáticas que pudessem interessar a diversificada "comunidade" dos EC, apontou 21 tópicos de interesse25 para articular o amplo e aberto debate com a participação de pesquisadoras e pesquisadores de vários países. Entre estes, constava aquele que é nosso principal foco de atenção neste artigo - Estudos Culturais, Educação e Pedagogia - sendo apresentadas várias propostas de painel para discussão de questões específicas relativas ao tema. Uma delas intitulava-se Cultural Studies and/in/as Education (Estudos Culturais e/em como Educação), sendo acompanhada da seguinte descrição:

A relação entre Estudos Culturais e o campo da educação permanece curiosamente contraditória: ela é subenfatizada no circuito dos estudos culturais em termos das relações históricas entre os dois campos, todavia, em termos de produção de estudos, expande-se rapidamente nos círculos da educação. Por exemplo, apesar da recorrente afirmação de Raymond Williams de que os estudos culturais se originaram do campo da Educação de Adultos, e apesar do fato de a atuação inicial do Centro de Estudos Culturais Contemporâneos26 ter incluído trabalho em educação e dois sucessivos Grupos de Educação, a educação de adultos como origem dos estudos culturais foi marginalizada em favor de uma preponderante narrativa que coloca a crise nas Humanidades e nas ciências sociais como momento originário dos EC, e a educação não é mais discutida nos círculos dos estudos culturais como um campo contributivo a este debate. Por outro lado, os estudos culturais emergiram e se expandem rapidamente na educação radical na América do Norte como sucessores da teoria e da pedagogia crítica e multicultural, além de estarem sendo institucionalizados em departamentos de estudos culturais e centros de educação. Este painel explora focos como a natureza e o perfil da relação contemporânea entre estudos culturais e educação; a contribuição que estudos culturais e educação podem aportar para seus discursos e práticas; exemplos de projetos concretos que mesclam educação e estudos culturais. 27

A proposição de um painel com tal descrição coloca em destaque o caráter controvertido dos laços entre Educação e Estudos Culturais, revelando, ao mesmo tempo, estarem eles insuficientemente problematizados e debatidos. No tópico Estudos Culturais, Educação e Pedagogia, além do painel mencionado, cuja justificativa incide especial e centralmente na necessidade de delineamento e debate destas polêmicas e plurifacetadas conexões, um conjunto paralelo de propostas indica o variado matiz das discussões, pesquisas e trabalhos que se inscrevem no âmbito destas aproximações. Abordagens sobre questões de metodologia e política na escolarização dos vários níveis, discussões sobre relações de poder no currículo e na sala de aula, bem como contribuições aos debates sobre infância, cidadania, identidade nacional, pedagogias culturais na pós-modernidade, a cultura do "outro", raça, gênero e etnia no capitalismo neoliberal, efeitos da globalização e do neoliberalismo na educação, o combate à contínua colonização dos saberes e das relações sociais nas escolas emergem das várias propostas formuladas.

Convém destacar, contudo, que, se continuarmos a percorrer o site desta conferência, perceberemos que de numerosos tópicos - e não só deste intitulado Estudos Culturais, Educação e Pedagogia - se poderiam recolher contribuições que interessam à educação e que podem ajudar a ampliar a gama de formas de problematização que crivam, matizam e complexificam os debates sobre educação nos dias atuais. Tomando apenas o tópico Teoria cultural, poderemos observar que os painéis abordam as ligações dos Estudos Culturais com conceitos-chave como liberdade, hegemonia, resistência, poder e subordinação. Convocam, também, para uma discussão sobre as conseqüências das grandes catástrofes contemporâneas sobre suas vítimas, tais como os êxodos e diásporas causados pelas guerras e outros acontecimentos dramáticos relacionados com atos terroristas, desastres ecológicos e a violência nos centros urbanos, nas periferias e no campo, em muitos países. As conexões entre cultura e poder são enfatizadas nos trabalhos que procuram desafiar as fronteiras disciplinares mediante estudos que exploram a transdisciplinaridade ou celebram a pós-disciplinaridade. Nessa direção surgem, igualmente, as análises críticas à divisão do trabalho e às fronteiras entre trabalho intelectual acadêmico e não-acadêmico. Incentivam-se debates sobre temáticas emergentes nos movimentos sociais e em circuitos intelectuais fora do eixo Europa América do Norte. A cultura das cidades é abordada com ênfase nos discursos pós-modernos sobre o espaço urbano. A experiência de viver na cidade é retomada nos cenários e problemáticas urbanas do século XXI, recompondo e explorando representações em que exóticos "outros" são posicionados. Também a natureza é discutida como o "outro" da cultura ocidental, aportando novos e importantes elementos para um criticismo das visões antropocêntricas. Estudos de mídia e literatura são articulados nesse cruzamento com questões ecológicas, delineando novas configurações e espaços para o encaminhamento destas preocupações.

Esse breve e superficial levantamento das questões abordadas por apenas mais um dos tópicos - Teoria cultural -, dentre os 2128 indicados para articular as discussões da "comunidade" internacional dos EC, constitui uma boa amostra de sua vitalidade. Não se verifica apenas uma surpreendente diversificação da gama de temáticas culturais, como também uma ampla transformação no que diz respeito a questionamentos e problematizações.

Se desejarmos pensar em Estudos Culturais em Educação na América Latina, isso implica, mais uma vez, refletirmos sobre os entendimentos compartilhados acerca desse campo ou desse movimento que cruza fronteiras, inaugura formas diferentes de pensar sobre quase tudo que acreditávamos resolvido, e não se quer estável, definitivo, certo, demarcado, aprisionado em territórios geográficos, disciplinares, teóricos ou temáticos. Uma possibilidade é conceber os Estudos Culturais em Educação como um partilhamento de entendimentos, de conceitos-chave e "formas de olhar" que eles trouxeram, principalmente, para as áreas das humanidades, da comunicação, da literatura. Entretanto, isso soa um tanto parcial e inexato, uma vez que não se trata apenas de "partilhar", "apropriar-se" ou "utilizar"; as "lentes" dos EC parece que vêm possibilitando entender de forma diferente, mais ampla, mais complexa e plurifacetada a própria educação, os sujeitos que ela envolve, as fronteiras. De certa maneira, pode-se dizer que os Estudos Culturais em Educação constituem uma ressignificação e/ou uma forma de abordagem do campo pedagógico em que questões como cultura, identidade, discurso e representação passam a ocupar, de forma articulada, o primeiro plano da cena pedagógica.

Se pensarmos o quanto a educação, a partir das contribuições da teoria crítica, vem se configurando como uma área de militância, de atuação política, vê-se quase como inevitável esta aproximação com os EC, já que estes também, em sua constituição e desenvolvimentos, têm uma face histórica de imbricações com a atividade política e crítica. Em contrapartida, a educação e a pedagogia têm se valido de vários outros campos disciplinares (Psicologia, Sociologia, Política, Medicina, Administração, para citar os mais conhecidos), às vezes de maneira mais restrita - vejam-se, por exemplo, entendimentos da pedagogia como mera adaptação de "ações" a presumíveis "formas de aquisição dos conhecimentos", predominantes nas chamadas pedagogias psi - outras, de maneira mais eclética, o que tem sido mais freqüente. Assim, na medida em que os EC incursionam por vários campos disciplinares, recolhendo, adaptando e aproveitando metodologias, achados etc., há uma certa "homologia" neste caráter híbrido tanto da educação quanto dos EC.

Se voltarmos nosso enfoque para as conexões entre os Estudos Culturais da América Latina e o amplo campo da educação, poderíamos experimentar uma decepção inicial diante da escassez de trabalhos que tematizem tal relação. Não podemos, entretanto, cair na cilada de que nada tenha sido dito ou feito nessa direção. Por um lado, temos esporádicas - mas não banais - reflexões sobre o papel e as características da escola dentro desse novo mundo híbrido, vista como um espaço em mudança nas novas configurações culturais. Por outro lado, é forçoso reconhecer a existência de estudos na área educacional que - principalmente através da influência dos olhares foucaultianos, da visão cultural e outros da pós-modernidade- aproximam-se grandemente do que se tem pensado no Brasil como Estudos Culturais em Educação. O abandono das metanarrativas da modernidade, a concepção da educação como campo de disciplinamento e de subjetivação, a consideração das dimensões de etnia, gênero, inclusive utilizando (outros) autores, como Kellner e Hall, marcam tais obras como temática e teoricamente aparentadas aos Estudos Culturais.29

Voltando à primeira hipótese - à abordagem da educação dentro das análises culturais, vemos que Canclini, por exemplo, em Culturas híbridas, não silencia sua reflexão frente aos muros da escola, mas a insere em seu poderoso pensamento, a partir, no caso específico, de um postulado "A escola é um palco fundamental para a teatralização do patrimônio" (Canclini, 1998, p. 164). Dialogando com estudos do campo pedagógico latino-americano, o autor faz breves e poderosas incursões motivadoras sobre os ritos, as práticas e os discursos circulantes na escola da América Latina, os quais tanto auxiliaram a separar os "selvagens" dos "civilizados", intentando construir estes últimos.

Também Sarlo tematiza a questão da escola, mas, diferentemente de outros autores e consoante com seu pensamento analítico, de certa forma lamenta uma escola perdida que não apenas teria sido um "instrumento de dominação", mas também foi, na América Latina (ou apenas na Argentina?), um "lugar simbolicamente rico e socialmente prestigioso" que também "distribuía saberes e habilidades que os pobres só podiam adquirir por meio dela", um "espaço laico, gratuito e teoricamente igualitário onde os setores populares puderam apropriar-se de instrumentos culturais que não deixariam de empregar para seus próprios fins e interesses" (Sarlo, 1997a, p. 117-118). Valendo-se de um retrato melancólico da escola atual, como o "lugar da pobreza simbólica", a autora argentina questiona os discursos correntes da pedagogia atual, que preconizam um "ensino tecnicamente modernizado que prepare para o trabalho e que, além disso, seja interessante para os alunos" (Sarlo, 2001, p. 104), a partir de aguda e detalhada análise das características das práticas e artefatos culturais contemporâneos.

Como exemplo singular de que idéias advindas dos Estudos Culturais também têm entrado capilarmente na reflexão pedagógica dos países de língua espanhola da América Latina, pode ser citado o recente artigo publicado por Marisa Vásquez Mazzini30 na revista virtual Pensar Iberoamérica - Revista de Cultura, sob o título aparentemente tradicional Resultados para quién? Reflexiones sobre la práctica de la evaluación em la escuela. Lançando mão de abordagens dos estudos culturais (explicitamente citados) a partir de autores como Giroux, McLaren, Grossberg, Steinberg e Kincheloe, a autora busca uma revisão da noção de prática escolar e avaliação.

Entre nós, no Brasil, as contribuições mais importantes dos EC em educação parecem ser aquelas que têm possibilitado: a extensão das noções de educação, pedagogia e currículo para além dos muros da escola; a desnaturalização dos discursos de teorias e disciplinas instaladas no aparato escolar; a visibilidade de dispositivos disciplinares em ação na escola e fora dela; a ampliação e complexificação das discussões sobre identidade e diferença e sobre processos de subjetivação. Sobretudo, tais análises têm chamado a atenção para novos temas, problemas e questões que passam a ser objeto de discussão no currículo e na pedagogia.

Nessa direção, projetos de pesquisa integrados ou individuais, trabalhos de iniciação científica, dissertações de mestrado e teses de doutorado têm sido produzidos nos últimos cinco anos, em especial no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na linha de pesquisa Estudos Culturais em Educação e em outros grupos que partilham de seu direcionamento teórico. Em uma primeira vertente, poderíamos citar aquelas questões, discursos e artefatos que, tradicionalmente tidos como pedagógicos, são ressignificados: livros didáticos, cartilhas, legislações educacionais, revistas pedagógicas, livros de formação pedagógica para professores, programas e projetos educativos, a própria seriação escolar, a ciclagem e as classes de progressão, a arquitetura escolar. Práticas escolares como a da merenda, da avaliação, ou dos cuidados na educação infantil, entre outras, são problematizadas e constituídas como objetos de estudo sob uma ótica cultural, oportunizando seu esquadrinhamento e análise como produtoras de significados, como imersas em redes de poder e verdade, em discursos circulantes, através dos quais se legitimam determinadas representações de crianças, de menino e de menina, de estudante, de professores e professoras, de trabalho docente, de alfabetismo, de determinados componentes curriculares e de educação.

Outra vertente de estudos tem sido aquela compreendida pela expressão "pedagogia cultural", a qual, conforme Steinberg e Kincheloe (2001, p. 14), inclui "áreas pedagógicas" entendidas como "aqueles lugares onde o poder é organizado e difundido, incluindo-se bibliotecas, TV, cinemas, jornais, revistas, brinquedos, propagandas, videogames, livros, esportes etc.". Com base nesse entendimento, têm sido investigados tanto variados veículos da mídia jornalística impressa e televisiva, contemplando não só matérias "informativas" mas também peças publicitárias, quanto produtos de entretenimento, tais como filmes, desenhos animados, seriados de TV; neles se têm buscado esquadrinhar seus "ensinamentos", pertencentes a uma gama também muito variada, valendo-se daqueles referentes à própria educação (escola, "progresso", professora, aluno etc.) e se espraiando para outros campos, como as lições sobre o bem e o mal, sobre o que é ser mulher, sobre o que é ser índio, sobre o que é a nação, sobre o que é natureza, sobre a tecnologia, sobre o nosso corpo, sobre a genética, sobre como nossa relação com os animais nos constitui "humanos" etc. Nessas lições, freqüentemente se estabelece o normal e, concomitantemente, o desviante; o "progressista", sinalizando para o "antiquado"; o certo, sinalizando para o errado, em um panorama que, marcado pelas questões culturais, é naturalizado e mostrado como "moderno", "atual", "biologicamente condicionado", "estando na ordem das coisas".

A questão das identidades - um dos pilares dos EC e que também tem se revelado central nos EC latino-americanos de língua espanhola - emerge com mais força nos trabalhos que discutem a heterogeneidade e hibridação de algumas delas, como as de gênero, de índio, de surdo (não mais visto como um "sujeito deficiente", mas como uma identidade mergulhada em cultura própria), regionais (o "gaúcho"), de jovem, de internauta freqüentador dos chats...31 Em tais discussões, o confronto entre o global e o local, entre a modernidade e a pós-modernidade, entre os discursos da tradição e os da contemporaneidade midiática assume um caráter central, num panorama ao qual a educação não se pode furtar, mesmo quando tenta mitigar a complexidade de tais processos.

Registre-se, ainda, que na abordagem de todas essas questões, os estudos culturais em educação - aliás, de acordo com sua vocação transdisciplinar e multifacetada - têm se valido de contribuições metodológicas e teóricas de outros campos, em especial daqueles com os quais mantêm maiores afinidades, como os Estudos Culturais da Ciência, os estudos de Gênero, a abordagem Pós-Colonialista, a análise foucaultiana do discurso, a Semiótica e a Análise Crítica do Discurso, os Estudos de Comunicação, realizando a alquimia conveniente a investigações que se propõem, como diz Giroux (1995) entre outras coisas, a "analisar a forma como a linguagem funciona para incluir ou excluir certos significados, assegurar ou marginalizar formas particulares de se comportar e produzir ou impedir certos prazeres e desejos" (p. 95).



A articulação dos Estudos Culturais com a escola: uma possibilidade

Finalmente, em nosso percurso pelas movimentações dos EC e por seus cruzamentos com a educação e a pedagogia, encontramos subsídios para afirmar que a educação se dá em diferentes espaços do mundo contemporâneo, sendo a escola apenas um deles. Quer dizer, somos também educados por imagens, filmes, textos escritos, pela propaganda, pelas charges, pelos jornais e pela televisão, seja onde for que estes artefatos se exponham. Particulares visões de mundo, de gênero, de sexualidade, de cidadania entram em nossas vidas diariamente. É a isto que nos referimos quando usamos as expressões currículo cultural e pedagogia da mídia. Currículo cultural diz respeito às representações de mundo, de sociedade, do eu, que a mídia e outras maquinarias produzem e colocam em circulação, o conjunto de saberes, valores, formas de ver e de conhecer que está sendo ensinado por elas. Pedagogia da mídia refere-se à prática cultural que vem sendo problematizada para ressaltar essa dimensão formativa dos artefatos de comunicação e informação na vida contemporânea, com efeitos na política cultural que ultrapassam e/ou produzem as barreiras de classe, gênero sexual, modo de vida, etnia e tantas outras.

Esta é uma preocupação central nos Estudos Culturais Contemporâneos, que Giroux (1995) sintetiza como "o estudo da produção, da recepção e do uso situado de variados textos, e da forma como eles estruturam as relações sociais, os valores e as noções de comunidade, o futuro e as diversas definições do eu" (p. 98). O próprio sentido de texto é alargado, referindo-se a sons, imagens e dispositivos microeletrônicos como os computadores e a Internet. Trata-se de textos culturais que no mundo contemporâneo atravessam as fronteiras entre Estados Nacionais, cidades e comunidades. É porque hoje nossos alunos e alunas passam mais tempo em frente à televisão do que na escola (mas não apenas por isso), que o sentido de realidade foi incrivelmente expandido. Simplesmente não podemos mais dizer que partimos da realidade se não considerarmos o poder constituidor e subjetivador da mídia no mundo atual.

Num breve recorte ilustrativo das aproximações dos EC com a escola, queremos ressaltar, ainda, que os objetos e temáticas que vimos mencionando estão relacionados com o que presenciamos em nossas salas de aula hoje. Se até pouco tempo atrás ensinar a partir da realidade significava considerar as particularidades sociais, econômicas e culturais de um grupo de alunos, vamos argumentar que o conceito de realidade foi sensivelmente ampliado para além de qualquer idéia de comunidade, de espaço, tempo e lugar e, especialmente, de uma identidade cultural estável. Tal compreensão, parece-nos, está diretamente implicada com o que vemos e deixamos de ver em nossas salas de aula e, logo, com as direções, com as escolhas que fazemos em termos do que ensinar e como ensinar. Se nos EC, a cultura é uma arena, um campo de luta em que o significado é fixado e negociado, as escolas, sua maquinaria, seus currículos e práticas são parte desse complexo.

Uma aproximação com o currículo pode ser feita baseando-se na noção de campo de luta, crescentemente utilizada nas análises curriculares críticas e pós-críticas32 que lançam mão da teoria cultural contemporânea. Quer dizer, "podemos ver o conhecimento e o currículo como campos culturais, como campos sujeitos à disputa e a interpretação, nos quais os diferentes grupos tentam estabelecer sua hegemonia" (Silva, 1999b, p. 135). Sendo construído culturalmente, o currículo reflete o resultado de um embate de forças e seus saberes e práticas investem na produção de tipos particulares de sujeitos e identidades sociais.

Esta noção, tomando contribuições do pensamento pós-estruturalista, especialmente aquela proveniente dos trabalhos de Michel Foucault, procura destacar uma certa dimensão do conceito de poder que alarga os sentidos circulantes na tradição crítica. Em outras palavras, não se trata de pura e simplesmente destacar que os grupos que estão em posição hierarquicamente superior em uma relação de poder definem o que deve ser ensinado, o que de fato ocorre, mas se trata de considerar a produtividade do poder, para além do binarismo dominadores e dominados. Em outras palavras, o que precisamos continuar a investigar, discutir, destacar, mostrar é a positividade do poder, sua capacidade de produzir subjetividades e identidades. É nesta direção que os Estudos Culturais têm enfatizado a produtividade dos poderes e saberes no ordenamento da vida social.

No que se refere ao papel do professor e da professora, novas formas de conceber a escola, os conhecimentos e o currículo, desafiam-nos a ultrapassar a noção de transmissores de informações. Sobretudo, seríamos produtores culturais e nossas práticas pedagógicas deveriam privilegiar a organização de experiências através das quais os estudantes pudessem vislumbrar o caráter socialmente construído "de seus conhecimentos e experiências, num mundo extremamente cambiante de representações e valores" (Giroux, 1995, p. 101).

Não se pode perder de vista uma dimensão do currículo como "lugar de circulação de narrativas, [...] lugar privilegiado dos processos de subjetivação, da socialização dirigida, controlada" (Costa, 1998, p. 51). Ainda que o ideário emancipatório seja o norte de nossas práticas docentes, ainda que objetivemos formar cidadãos críticos e autônomos, e que tais concepções sustentem a seleção dos conhecimentos e experiências que compõem o currículo, o que fazemos é estruturar o campo de ação do outro, é governar sujeitos (Foucault, 1995). Através das palavras que escolhemos (nos escolheram) para olhar para a educação escolar e o currículo estamos compondo uma certa representação de realidade e dirigindo condutas, produzindo determinados tipos de subjetividades e identidades, sintonizados com a realidade que as palavras compõem.



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